A ONU, através da UNCTAD, reconhece que o comércio internacional e a interconectividade que se vive no mundo de hoje permitiram que os bens e serviços se produzam e comercializem globalmente, ajudando a tirar milhões de pessoas da pobreza, e contribuindo deste modo para que seja possível o cumprimento dos objetivos da Agenda 2030 para um Desenvolvimento Sustentável.
Os números recolhidos das bases de dados da UNCTAD[1] (quadro infra) comprovam-no. Um crescimento enorme nos últimos 50 anos, naturalmente com pesados custos ambientais[2] que agora se pretendem reparar.
Designação | 1970 | 1990 | 2019 |
População mundial (10³) | 3 700 437,00 | 5 327 231,00 | 7 713 468,00 |
PIB Mundo (10³ USD) | 3 418 983 000,00 | 23 008 701 000,00 | 87 445 066 000,00 |
Exp Mundo (10³ USD) | 318 153 000,00 | 3 495 675 000,00 | 19 014 756 000,00 |
Rend. P. Capita (USD) | 994,00 | 4 303,00 | 11 339,00 |
[valores a preços correntes] [Fonte UNCTAD]
A logística deste impressionante volume de carga sujeito ao cumprimento de normais legais instituídas pelos Acordos celebrados – barreiras ao comércio – requer alfândegas modernas, o que pressupõe, gestores dinâmicos, trabalhadores competentes e motivados, e sistemas informáticos em rede que permitam a passagem pela fronteira de forma célere, tendo sempre presente o equilíbrio entre a facilitação e o controlo.
Em abstrato, os operadores económicos são, a priori, todos eles cumpridores e conhecedores das mercadorias que transacionam, não havendo também razão para pensar que as alfândegas tenham algum interesse em paralisar as mercadorias nas fronteiras. Quando o fazem é, com certeza, no estrito cumprimento da sua missão[3].
A realidade é, no entanto, um pouco mais complexa. Quando se diz que faz parte da missão das autoridades aduaneiras proteger a União contra o comércio desleal e ilegal, apoiando simultaneamente as atividades económicas legítimas, está implícito que nos milhões de transações de produtos que se fazem diariamente há sempre uma maior ou menor percentagem de casos que requerem especiais cuidados. E mesmo para a grande maioria, cuja livre prática aduaneira, em muitos casos, é condicionada por livre prática fitossanitária ou de segurança, requer uma boa análise do risco, sob pena de não se apoiarem as atividades legítimas e tornar os custos de paralisação nas fronteiras incomportáveis[4].
Não chegam a 50 mil as autorizações do estatuto AEO concedidas por cerca de 97 países, dos 183 membros da OMA. (…) A U.E. tem registados mais de 7 milhões de OE na sua base de dados EORI e menos de 0,25% são AEO!
Serve isto para dizer que os organismos internacionais que se preocupam com estas questões, como é o caso da OMA – Organização Mundial das Alfândegas[5], que criou em 2005 o Programa do Operador Econômico Autorizado (AEO) amplamente reconhecido como um elemento fundamental para uma forte parceria alfandegária-negócios, para um ambiente comercial seguro, transparente e previsível e, de forma mais geral, para maior prosperidade económica.
No dizer da OMA, o programa AEO oferece uma oportunidade para que as Alfândegas partilhem as suas responsabilidades de segurança com operadores do setor privado, ao mesmo tempo que os recompensa com uma série de benefícios adicionais de facilitação, tais como níveis reduzidos de controle, procedimentos simplificados, pagamento diferido e benefícios de reputação, bem como benefícios de facilitação além das fronteiras por meio de ARM (Acordos de Reconhecimento Mútuo).
Porque somos adeptos deste tipo de Parceria fomos verificar do seu grau de adesão, quer ao nível da U.E, quer dos restantes países membros da OMA, e constatamos que eles estão em quase todos os países, mas ainda serão poucos. Veja-se o gráfico seguinte quanto à U.E.
O somatório das IMP+EXP da Alemanha (de e para terceiros países) corresponde a 25% da U.E e tem cerca de 39% dos AEO desta! Portugal tem 0,94% do comércio externo da U.E e 0,778% dos AEO!
Quanto ao Mundo,
A OMA, no seu COMPENDIUM OF AUTHORIZED ECONOMIC OPERATOR PROGRAMMES – edição 2020, dá-nos conta que
– 97 programas AEO estão em vigor e 20 programas AEO estão em desenvolvimento;
– 33 programas de conformidade alfandegária estão em vigor e 4 outros programas de conformidade devem ser implantados em breve;
– 87 ARM bilaterais foram concluídos, bem como 4 ARM multilaterais / regionais e 78 ARM estão em curso de negociação.
O gráfico Mundo, mostra-nos o seguinte cenário:
Em conclusão:
Não chegam a 50 mil as autorizações do estatuto AEO concedidas por cerca de 97 países, dos 183 membros da OMA. Como resulta da legislação aduaneira da U.E (e nos outros países é semelhante), para a obtenção do estatuto AEO é necessário, nos termos dos art.ºs 38.º e 39.º do CAU, que operador económico cumpra um conjunto de critérios que têm que ver com ética nos negócios; solvabilidade financeira; existência de um sistema de informação que permita a qualquer momento o controlo dos fluxos reais e financeiros das mercadorias transacionadas em comércio internacional; competências técnicas relacionadas com a atividade exercida e outros se o AEO incluir a Segurança.
Sendo certo que a maioria dos representantes aduaneiros, bem como as empresas que se internacionalizam estão hoje certificadas por normas internacionais de qualidade, e cumprirão, em princípio, os critérios acima citados, estranha-se que haja tão poucos. A U.E. tem registados mais de 7 milhões de OE na sua base de dados EORI e menos de 0,25% são AEO!
Não temos a mínima dúvida que as alfândegas funcionam tanto melhor quanto mais competentes forem aqueles que se apresentam a declarar as respetivas mercadorias, sejam eles os representantes aduaneiros, sejam eles os próprios importadores e/ou exportadores, e também não temos dúvidas que se tiverem o estatuto AEO, tanto melhor.
Diz-nos a experiência que, ainda que o sistema informático possa não dispor de informação que lhe permita avaliar se o declarante é ou não AEO, o certo é que o decisor aduaneiro vai sentir-se mais confortável perante este, e o importador ou o exportador, na hora de escolher, quando o preço já não mandar, vai decidir AEO.
[1] United Nations Conference on Trade and Developement.
[2] Os três maiores emissores do mundo – China, Estados Unidos e Índia – respondem por cerca de 50% das emissões globais de CO2, e os 20 maiores emissores do mundo respondem por 80%.
[3] -art.º 3º do CAU- Código Aduaneiro da União
[4] Estima-se que os custos comerciais associados às medidas não tarifárias representem até 1,6% do PIB mundial.
[5] estabelecida em 1952 como o Conselho de Cooperação Aduaneira (CCC), é um órgão intergovernamental independente cuja missão é aumentar a eficácia e eficiência das administrações aduaneiras.
ANTÓNIO PINTO RIBEIRO
Consultor Aduaneiro e Fiscal