As companhias de navegação não devem cair na tentação de ganhar com a crise da Covid-19, avisa o presidente executivo da APAT, em declarações ao TRANSPORTES & NEGÓCIOS.
Com os custos operacionais em baixa e menos carga para transportar, não se percebe por que os fretes marítimos aumentam e há dificuldade em encontrar espaço nos navios. Esta, em síntese, a contradição encontrada por António Nabo Martins (APAT) na actual evolução do mercado de transporte marítimo de contentores.
Na semana passada, a Assimagra, associação das indústrias da pedra, alertou para a falta de contentores e de navios para escoar as encomendas para os mercados externos. O presidente executivo da APAT, associação dos transitários, admite que o caso não será único, mas explica que a escassez de capacidade de transporte terá a ver, desde logo, com o balanceamento dos fluxos de import-export: “Como agora se importa menos, haverá menos navios a virem aos nossos portos e menos contentores a circular, é normal”.
Diferente, porém, é a redução abrupta da oferta da capacidade promovida pelas companhias de navegação, com sucessivas anulações de viagens, que estão a pôr os carregadores à beira de um ataque de nervos. Uma situação que a APAT acompanha no mercado nacional, mas também ao nível europeu, no seio da CLECAT (onde Nabo Martins é presidente do Instituto Marítimo).
Os armadores justificam a redução da oferta com a fraca procura, mas a subida dos fretes “permite perguntar se não estarão as companhias empenhadas em ganhar o mesmo transportando muito menos carga”, alvitra o presidente executivo da APAT. Até porque, lembra, “o preço do petróleo está em níveis históricos baixos, com o necessário reflexo no preço do combustível”.
Com pouco espaço disponível a bordo e os fretes em alta, as cargas de menor valor acrescentado – como a pedra extraída pelos associados da Assimagra – tendem a ficar para trás na hora do embarque. O que implica prejuízos vários. Desde logo pela permanência prolongada nos parques de contentores. “Já antevendo isso, há cerca de duas semanas escrevemos a todos os agentes de navegação pedindo-lhes a máxima atenção e informação atempada para evitar os sobrecustos de “detention and demurrage”, refere o dirigente dos transitários.
Porque com os portos à beira da saturação (com muitos contentores por levantar), qualquer atraso na tramitação das cargas, na sua verificação, no desembaraço alfandegário “significa custos extra. E as companhias não devem utilizar as dificuldades extra de uma situação extraordinária para aumentarem as suas receitas”, reforça. Além do mais porque, avisa, “podem facilmente distorcer o mercado e as regras da concorrência”.
A propósito, Nabo Martins lembra que até ao momento a APAT não obteve resposta ou reacção à proposta que fez, no início desta crise, para a a redução ou mesmo eliminação das taxas de utilização das infra-estruturas de transporte. “Mas se não baixaram, também não aumentaram…”, sublinha.
Faltam ajudas à exportação
Com uma boa parte da economia parada pela Covid-19, ajudar as empresas que continuam a laborar, e em particular aquelas com capacidade exportadora é imprescindível. Mas também aí se ouvem críticas. Nomeadamente à redução dos seguros de crédito. Nos últimos dias, várias foram as notícias que fizeram eco de críticas à COSEC, por exemplo.
O presidente executivo da APAT diz não ter recebido queixas formais de carregadores ou transitários, mas, de novo, diz que o tema tem sido falado ao nível europeu.
“Se há coisa que a Covid-19 tornou evidente é que o nosso tecido empresarial é constituído e alimentado fundamentalmente por micro, pequenas e médias empresas. E essas precisam de ser apoiadas, porque serão elas os principais motores da retoma que se deseja. Neste contexto, não se compreende que sejam criados entraves aos apoios à exportação. Pelo contrário, tudo deveria ser feito para facilitar o comércio e a movimentação das mercadorias”, refere.