Quais os riscos de uma interferência estrangeira nos portos europeus? Que medidas devem ser adotadas a nível europeu para reduzir as vulnerabilidades destas infraestruturas essenciais para o comércio mundial?
Estes foram os pontos de partida de um relatório do Parlamento Europeu sobre uma Estratégia Portuária Europeia, aprovado em janeiro. Em nome dos socialistas (S&D), contribui para um parecer da Comissão do Comércio Internacional. A influência estrangeira nos portos da UE deve ser limitada e apelamos à Comissão Europeia e aos governos da UE para que avaliem urgentemente os riscos do envolvimento de países terceiros em infraestruturas marítimas. Por razões económicas. Por razões de segurança.
Os portos europeus são responsáveis pela entrada e saída de 74% das mercadorias na UE. Como infraestruturas críticas, desempenham um importante papel na resiliência da União Europeia. Nas cadeias de abastecimento e em áreas-chave como as transições verde e digital ou no reforço da segurança energética. São fundamentais no fornecimento, produção, armazenamento da energia e na transformação ecológica dos transportes e da indústria.
No novo contexto geopolítico, na sequência da guerra na Ucrânia e do recrudescimento do conflito israelo-palestiniano, os portos são cruciais na manutenção das rotas comerciais e na operacionalidade das cadeias de abastecimento. Mas não só. Também o são na criação de novas rotas alternativas, incluindo vias humanitárias e de solidariedade e a promoção da diversificação da oferta. É importante ainda recordar que durante a pandemia os portos foram essenciais na continuidade do funcionamento das cadeias de abastecimento de emergência.
Mas os portos europeus são também uma âncora do equilíbrio social e económico e um fator de crescimento das regiões. São nós de redes internacionais e de redes comerciais regionais, a par do transporte ferroviário, das ligações rodoviárias e aéreas, que merecem igual atenção em termos de segurança, resiliência e competitividade.
Os investimentos em portos por parte de intervenientes estatais estrangeiros, designadamente de regimes autocráticos, têm sido significativos nos últimos vinte anos. Empresas estatais chinesas têm procurado adquirir participações de controlo em vários portos europeus, particularmente durante a crise financeira de 2008/2011. Atualmente estima-se que existe um controle total ou parcial sobre 14 portos na União Europeia e sobre 10% da atividade do transporte marítimo europeu. Estes investimentos fazem parte de uma estratégia que visa ganhar influência sobre as principais infraestruturas navais europeias e é uma relevante questão de segurança económica no atual contexto geopolítico.
A Comissão Europeia deve propor uma Estratégia Portuária Europeia abrangente que garanta a competitividade dos portos europeus, (…) assegurando ao mesmo tempo a sua independência em relação aos portos de países terceiros.
A interferência estrangeira em infraestruturas críticas europeias é problemática; tem potencial para minar a segurança, a independência económica e a resiliência de Estados-membros e da União Europeia. Ao permitir essa influência estrangeira, a UE torna-se mais vulnerável do ponto de vista económico e corre o risco de sofrer pressões ilegítimas de países terceiros.
Mas não basta que um Estado-membro recuse estes investimentos. Corre-se o risco de que estes se desloquem simplesmente para um concorrente ou para um Estado-Membro vizinho. É por isso que uma abordagem europeia é crucial, especialmente porque uma vulnerabilidade num Estado-Membro é uma vulnerabilidade para a União Europeia.
É urgente que os Estados-Membros e os portos adotem uma abordagem estratégica comum e rigorosa para o desenvolvimento das infraestruturas críticas. A Comissão Europeia deve propor uma Estratégia Portuária Europeia abrangente que garanta a competitividade dos portos europeus, fazendo com que beneficiem de investimentos, inovação, digitalização e condições de concorrência equitativas a nível mundial e assegurando ao mesmo tempo a sua independência em relação aos portos de países terceiros.
Esta estratégia deve estabelecer condições claras para o investimento estrangeiro e criar um quadro adequado para que os investidores públicos e privados europeus apostem em infraestruturas portuárias críticas e reforcem a resiliência das portas de entrada para a economia europeia. A UE precisa e a sua autonomia estratégica faz-se igualmente da abertura económica ao mundo, através dos seus portos, condição também para manter a prosperidade e o emprego a nível interno.
MARGARIDA MARQUES
Deputada Europeia, membro da Comissão para o Comércio Internacional do PE
Infelizmente a “bota não bate com a perdigota”. Na teoria é tudo muito “redondo” e bonito, mas depois, na prática, criam-se condições para tirar competitividade aos portos europeus face aos seus vizinhos. Vide o que se passou com o ETS e com a ânsia europeia de se antecipar à IMO. É o eterno problema de serem os politicos a decidir sobre questões e assuntos que conhecem apenas pela rama.