Este poderia ser o título de mais um filme da saga em que John McClane, personagem interpretada por Bruce Willis, se prepara para salvar o mundo (ou parte dele).
Agora que já tenho a sua atenção, é altura de desenvolver este guião que está longe de ser ficção.
A história fala de um pequeno país (ou de países que insistem em ser pequenos) que, apesar do seu poder de voto em importantes centros de decisão internacionais, persiste em se manter alheado do progresso e do desenvolvimento que estariam ao seu alcance…
As regras aplicáveis ao transporte de mercadorias perigosas são muito mais do que medidas de prevenção e segurança ou mera redução do risco e, tal como acontece com outras áreas temáticas, mexem com a economia e competitividade dos países, das empresas e dos cidadãos.
Quando, por exemplo, se definem ensaios, requisitos construtivos ou obrigações e proibições, importa ver para além do que é obvio e identificar a quem podem servir ou eventualmente prejudicar…
Recordo o momento em que, na transição do milénio, a pretexto de uma aumento de segurança não quantificado regulamentarmente, se destruiu um número não determinado de pequenas empresas que se dedicavam ao fabrico de cisternas de matéria plástica/fibra.
Tal aconteceu pela obrigatoriedade de construção de um protótipo que seria “destruído” durante ensaios para aprovação de cada tipo/modelo de cisterna. Estes ensaios pretensamente dariam “maior garantia” de segurança.
Esta “novidade” regulamentar impactou fortemente os custos unitários das empresas com baixas produções (maioritariamente no sul da europa e bacia do mediterrâneo), e as suas pequenas produções acabaram por ser devoradas pela capacidade das grandes empresas do norte da europa (aquelas que propuseram as regras).
Por esta e outras razões semelhantes é imprescindível acompanhar e analisar as matérias em discussão nos diferentes fóruns internacionais e manter a máxima atenção nas implicações passíveis de poderem afetar a economia nacional, sob pena de nos termos de conformar à decisão de terceiros.
Também no WP.15, estrutura responsável pelas atualizações do Acordo relativo ao transporte internacional de mercadorias perigosas (ADR), onde Portugal deteve por mais de 20 anos a presidência dos trabalhos deste grupo, pela 1ª vez em várias décadas não houve disponibilidade para Portugal estar (sequer) representado!
No que respeita ao transporte de mercadorias perigosas, há um conjunto de estruturas internacionais que o Estado português deveria acompanhar com particular interesse estratégico.
A saber:
- O Subcomité de peritos do transporte de mercadorias perigosas das Nações Unidas (ECOSOC), Subcomité TDG, responsável pela produção do “Livro Laranja”;
- A Reunião Comum RID/ADR/ADN das Nações Unidas (UNECE) e da OTIF;
- O grupo de trabalho do transporte rodoviário de mercadorias perigosas WP.15 (UNECE);
- O Comité de Segurança Marítima (MSC) da Organização Marítima Internacional (IMO).
Por exemplo, na 60.ª sessão plenária do Subcomité TDG, que teve lugar na primeira metade de 2022, a representação mais numerosa foi a chinesa com 29 delegados, seguiram-se os Estados Unidos da América com 16, a Alemanha com 12 e a Coreia do Sul com 11, numa sessão com mais de 200 participantes, entre representações nacionais de 25 países, organizações intergovernamentais, órgãos das Nações Unidas e organizações não governamentais.
Portugal, um dos 30 países com direito de voto nestas matérias (que, a cada dois anos são adaptadas aos diferentes modos de transporte), uma vez mais não esteve presente, apesar da possibilidade de participação remota…
Também no WP.15, estrutura responsável pelas atualizações do Acordo relativo ao transporte internacional de mercadorias perigosas (ADR), onde Portugal deteve por mais de 20 anos a presidência dos trabalhos deste grupo, pela 1ª vez em várias décadas não houve disponibilidade para Portugal estar (sequer) representado!
É claro que não basta estar presente. É necessário participar ativamente, de forma elevada, continuada e atenta, auscultando previamente as forças vivas nacionais potencialmente afetadas pelas medidas em discussão.
A falta de investimento na renovação de recursos humanos na administração pública, associada à falta de visão estratégica da generalidade dos decisores políticos, conduz-nos à inevitabilidade da nossa condição de espetadores, quando deveríamos ser atores (ou mesmo autores) do nosso destino.
Aquando da última intervenção da troika em terras lusas, não foi mero acaso o corte substancial nas autorizações de deslocação para acompanhar reuniões internacionais…
O que talvez seja mais difícil de entender é o nível de participação estar hoje ainda mais baixo do que anteriormente.
Sem querer identificar vilões ou heróis, importa reescrever o guião e, de uma vez por todas, decidir qual o caminho que queremos ou não queremos trilhar, pois o assalto às estruturas de decisão e influência está permanentemente em curso.
Seguramente.
JOÃO CEZÍLIA
Especialista em transporte de mercadorias perigosas
Muito bem pontualizado. Com o espírito pequeno nunca sairemos da mediocridade. Cada vez mais pequenos e sem soberania.