O uso de combustíveis como o LNG (Liquified Natural Gas) permite aos armadores baixar as emissões de gases poluentes, deixando-os no caminho para chegarem à redução da pegada ecológica no futuro. O Shipping tem definido no seu mapa a curto/médio prazo a descarbonização, sendo uma das áreas económicas onde este desafio parece apresentar ainda assim grandes dificuldades.
De acordo com a IEA (Agência Internacional de Energia), o Shipping representou cerca de 10% das emissões de CO2 em 2019 no setor dos transportes, e cerca de 2% da energia do seu setor.
Existe um número crescente de regulamentações sobre os gases de estufa e emissões poluentes, que irão trazer uma ameaça real ao Shipping nos próximos anos. O uso de grandes navios, e o seu tempo médio de vida, levam a que estas alterações no tipo de combustível usado tenham, assim, um custo elevado.
A regulamentação IMO2020, que entrou em produção a 1 de janeiro de 2020, obrigou a que os navios usassem combustíveis que emitissem menos de 0,5% de gases sulfurosos para a atmosfera. Vários armadores mudaram o combustível usado até então, para outros que cumprissem as novas regras, mesmo que mais caros. Outros, por seu lado, continuaram a usar os mesmos combustíveis do passado, mas instalaram mecanismos (filtros de partículas ou scrubbers), que permitissem o cumprimento dessas metas. Uma terceira opção foi a adoção do LNG como combustível.
Esta nova regulamentação foi a responsável pela opção do LNG como combustível para novas unidades a serem construídas em alguns casos, mas outro fator foi a redução das emissões de CO2 em cerca de 20 a 25%, quando comparadas com os combustíveis anteriormente utilizados. A previsão é que seja o combustível dominante para os próximos 10 anos. A par do menor número de emissões de CO2, o LNG liberta menos cerca de 95% de óxido de nitrogénio (NOX), e emite menos de 99% de partículas, não emitindo, em teoria, gases sulfurosos. Estima-se que se toda a frota existente em 2015 fosse transformada para LNG, assistiríamos a uma redução de 15% da emissão de gases de estufa, apenas com essa mudança nos motores. A instalação de scrubbers (gráfico 1), tem tido alguma evolução, mesmo ao nível dos grandes armadores, mas existem países onde o uso dos mesmos tem sofrido algumas condicionantes ao nível da regulamentação e legislação local.
Um dos problemas associados ao uso de LNG é a possibilidade de libertação de gás metano em caso de fuga, gás esse que captura cerca de 86 vezes mais calor na atmosfera que o mesmo montante de CO2 num período de 20 anos.
Existem alguns desafios pela frente para atingir as metas definidas. A IMO (International Maritime Organization) definiu alguns objetivos nas emissões de CO2, reduzindo em 40% a emissão de gases até 2030, tendo como base as emissões registadas em 2008, e alcançando uma redução de 70% até 2050.
A DNV GL estima que combustíveis livres de carbono ocupem cerca de 39% do mix energético usado no Shipping em 2050, deixando o LNG com 23% de quota.
Outro dos constrangimentos é a inclusão das emissões geradas pelo Shipping no sistema da união europeia ETS (European Trading System). Ações como a redução de velocidade (slow steaming), a instalação de dispositivos de poupança de energia, o uso do vento e novas tecnologias de redução de atrito das tintas usadas no casco dos navios podem também ser algumas das soluções, esperando com algumas destas e outras alterações, atingir a tão esperada neutralidade carbónica. O abastecimento elétrico de navios em cais (on shore power) pode potenciar uma redução considerável da poluição em porto, mas também proceder ao carregamento de baterias para alguns navios que não façam grandes viagens.
Em novembro 2020, a CMA-CGM efetuou o abastecimento do seu navio CMA CGM Jacques Saadé com LNG (contará com um total de nove navios de 23.000 TEU’s, movidos a LNG num futuro próximo), contendo um mix de 13% de bio-LNG, esperando também 26 novas unidades de vários tamanhos, que usarão este combustível. No fim de 2020, tinha cerca de 7 navios movidos a LNG. São já bastantes os navios movidos a LNG a nível mundial (Gráfico 2), encontrando-se os mesmos em operação distribuídos um pouco por todo o mundo (Gráfico 3).
Os combustíveis alternativos em uso vão desde o LNG, o metanol, LPG, biofuel, amónia, hidrogénio e eletricidade, representando, de acordo com a Clarksons Research Services, apenas 3,7% da frota atualmente existente em termos de Tonnage, mas ao nível das ordens existentes para novas construções os novos combustíveis contam já com cerca de 29,4%.
O LNG é o mais consensual de momento, com bastantes unidades já a navegar, até pela larga rede de abastecimento com que conta já hoje em dia, em vários pontos do globo (gráficos 4 e 5). Estima-se que cerca de 128 portos já forneçam este tipo de abastecimento, de acordo com a Clarksons, comparativamente com os cerca de 60 há cinco anos, e apenas 12 uma década atrás. Nos próximos 3 anos, mais 70 portos devem juntar-se à rede de abastecimento deste combustível.
Apesar do alto custo verificado nos dias de hoje – cerca de três vezes mais caro que o LNG – espera-se que o hidrogénio líquido possa também ter boas hipóteses de sucesso num futuro próximo. Não existe, porém, um consenso alargado, dada a falta de legislação até ao momento, bem como a sua alta taxa de inflamabilidade, quando comparado com os restantes.
A escolha pelo uso de amónia pode ser outra das alternativas, visto ter uma rede de distribuição/abastecimento já implementada, pois também é usada como fertilizante. A sua densidade energética é mais alta que o hidrogénio, deixando assim mais espaço para a carga, mas a sua toxicidade, emissões e fonte de energia altamente inflamável, continuam a ser um desafio, bem como o seu custo, cerca de 4 vezes mais que o LNG.
O uso de metanol, baterias elétricas (para trajetos curtos, com grande desenvolvimento na região nórdica, de momento) ou energia atómica trazem ainda algumas dúvidas para o Shipping, aumentando assim os problemas por resolver na possível futura adoção destes combustíveis.
É, assim, esperado um cocktail de combustíveis a ser usado nos próximos anos. A DNV GL estima que combustíveis livres de carbono ocupem cerca de 39% do mix energético usado no Shipping em 2050, deixando o LNG com 23% de quota. O vencedor não é, assim, ainda claro nesta fase, podendo haver alguma alteração de relevo no cocktail energético nos próximos anos. O posicionamento dos grandes armadores no caso da carga contentorizada pode definir alguns dos caminhos a serem adotados, tendo em conta o reabastecimento destas unidades por todo o mundo.
A aposta para os próximos anos parece para já ser o LNG. Contudo, muitas são as alternativas em estudo neste momento, sendo a região nórdica um polo de desenvolvimento de estudos e novas legislações e regulamentação para um mundo mais limpo. Muito se tem trabalhado na IMO, e em vários estudos sobre o tema, não sendo ainda certo o rumo a longo prazo. Temos, porém, uma certeza: não será pagando o prejuízo, mas taxando as emissões nos próximos anos que trará alguma rapidez no processo, e a União Europeia irá fazer uma forte aposta nesta descarbonização, trazendo o programa verde para o mundo do Shipping nas próximas décadas.
PEDRO GALVEIA