A construção de novas linhas em bitola europeia não é uma prioridade, nem sequer uma condição para o sucesso dos operadores de transporte de mercadorias nacionais, foi dito no seminário de transporte ferroviário promovido pelo TRANSPORTES & NEGÓCIOS.
Mais do que a mudança de bitola, o que Paulo Niza, director comercial da CP Carga, e Miguel Lisboa, administrador executivo da Takargo, reclamaram foi a resolução dos estrangulamentos que persistem na rede ferroviária nacional, e que limitam, ou mesmo inviabilizam, a capacidade do comboio concorrer com o modo rodoviário.
As rampas, a falta de electrificação de alguns troços da rede, a falta de capacidade da via, os horários dos terminais, as deficientes ligações aos portos foram exemplos de constrangimentos apontados por aqueles responsáveis.
Ouvindo-os, ficou a ideia de que a Península Ibérica, e não apenas o território nacional, é o mercado natural para os dois operadores. Mas mesmo esse não está isento de dificuldades, nomeadamente quando se fala em transporte intermodal, por causa dos custos envolvidos e das dificuldades em rendibilizar as operações.
Chegar mais longe, ao Centro da Europa, é possível, e desejável (Paulo Niza lembrou o caso do comboio para a Alemanha). Mas mesmo isso não justificará o investimento numa nova rede de bitola UIC. Porque os operadores investiram em material circulante para a bitola ibérica, e porque o mercado alemão, por exemplo, representa uma pequena fracção do mercado peninsular, argumentou Miguel Lisboa.
Com maior capacidade de investimento e, logo, também uma visão de mais longo prazo, a DB Schenker continua a apostar forte no seu comboio para a Alemanha. Frank Gutzeit, director geral da empresa em Portugal, apresentou as características gerais do serviço e prometeu melhorias para a segunda ligação semanal, que hoje mesmo arrancou. Curioso: oito horas para a transferência de cargas na fronteira de Irun foi considerado um tempo gerível.
Vítor Caldeirinha, presidente da Adfersit, defendeu as ligações à Europa para o transporte de mercadorias, em bitola UIC, recorrendo à construção de raiz de novas vias ou optando pela instalação do “terceiro carril”. Mas deixou dois avisos sobre o “desígnio nacional” da ligação de Sines ao centro da Europa para encaminhamento dos contentores: o alargamento do canal do Panamá terá um efeito mitigado nas ligações à Europa; e as cargas marítimas tenderão a continuar a ser baldeadas para navios feeder. Palavras de um gestor e especialista portuário.
De tanto se falar em Alta Velocidade e de novas ligações à Europa, a rede convencional – a única que temos– vai ficando esquecida e vai-se degradando, denunciou o presidente da Associação Portuguesa dos Amigos do Caminho-de-Ferro.
Recorrendo a lugares comuns, bom senso e pragmatismo q.b., Nelson Oliveira defendeu que se tire o máximo partido da rede existente, melhorando a infra-estrutura onde tal se justifique e revendo a oferta de serviços para captar mais clientes. Até porque, lembrou, é pouco provável que uma nova rede esteja operacional dentro de 10-15 anos. Sem embargo, o presidente da APAC sustentou também a necessidade de uma visão integrada, com todos os modos de transporte, no momento de decidir novos investimentos em infra-estruturas.
Em tempo de “vacas magras” no que toca a investimentos em transportes em Portugal, os PALOP, e em particular Angola e Moçambique, oferecem escapatórias que importa aproveitar. Rui Lucena deu conta da experiência da Fernave na “exportação” do know-how nacional para aqueles países e deixou o lamento sobre a falta de empenhamento público, a vários níveis, na promoção de uma “ofensiva” empresarial lusa sobre aqueles mercados.
O Seminário de Transporte Ferroviário do TRANSPORTES & NEGÓCIOS teve o apoio do Grupo Barraqueiro e do Grupo Veolia Transdev.
As comunicações dos oradores convidados estão disponíveis em http://www.transportesenegocios.com.pt/.