Este texto analisa a expansão do Porto de Sines através da construção do novo Terminal Vasco da Gama (TVG), com enfoque nos seus impactos nos domínios económico, logístico, ambiental e social.
A relevância estratégica desta infraestrutura, tanto a nível nacional como internacional, justifica a escolha do tema, considerando a crescente necessidade de Portugal reforçar o seu papel nas cadeias logísticas globais. O objetivo é compreender de que forma este novo terminal poderá transformar o panorama portuário nacional e quais os principais desafios associados à sua implementação.
A análise baseia-se em fontes institucionais, documentos técnicos e publicações especializadas disponíveis online. Complementarmente, inclui-se a visão de um especialista entrevistado com experiência operacional no setor marítimo-portuário, cuja perspetiva contribuiu para o aprofundamento da compreensão dos desafios e das oportunidades relacionadas com o novo terminal.
O Porto de Sines é atualmente o maior porto nacional em volume de carga movimentada e um dos mais relevantes do sudoeste europeu. A sua localização em mar aberto, a profundidade natural superior a 20 metros e o reduzido risco de assoreamento conferem-lhe condições excecionais para a receção de navios de grande porte. Estas características físicas são acompanhadas por infraestruturas modernas de controlo e gestão, com sistemas de monitorização marítima, segurança integrada e fornecimento de serviços básicos a navios, como água e energia elétrica.
Apesar destas vantagens naturais, subsistem constrangimentos estruturais, nomeadamente ao nível da conectividade terrestre. A ligação ferroviária ao interior e à fronteira espanhola permanece em processo de requalificação há vários anos, apresentando limitações técnicas e operacionais, como a lentidão, interrupções e incapacidade de receber comboios de grande dimensão. Por outro lado, as ligações rodoviárias, especialmente através da A26, mantêm-se incompletas, contribuindo para o aumento dos custos logísticos, sobretudo no transporte de mercadorias com origem ou destino na região de Lisboa.
A escassez de plataformas logísticas intermodais de grande escala nas imediações do porto constitui outro entrave à competitividade. A zona industrial adjacente, embora com potencial, permanece subaproveitada e pouco articulada com a ferrovia. A ausência de um terminal logístico interior eficaz limita a expansão do hinterland e a eficiência da distribuição.
Do ponto de vista marítimo, Sines beneficia de uma rede consolidada de ligações com várias regiões do globo, incluindo a Ásia, América do Norte, América do Sul e Norte de África. O porto desempenha um papel importante no modelo de transbordo, com escalas regulares de grandes operadores globais. A aposta na digitalização, nomeadamente através da Janela Única Logística (JUL), tem vindo a modernizar os fluxos de informação e a facilitar a articulação entre os diversos intervenientes. Contudo, a ausência de uma zona franca ou entreposto aduaneiro competitivo limita a capacidade de atrair operações de valor acrescentado, nomeadamente face a outros portos do Mediterrâneo.
A construção do Terminal Vasco da Gama surge como resposta à necessidade de reforçar a capacidade portuária instalada, posicionando Sines como um hub estratégico de escala global. Com capacidade para receber navios de até 24.000 TEU, o novo terminal permitirá aumentar significativamente a capacidade global do porto, estimando-se um acréscimo de mais 3 milhões de TEU anuais. Este aumento poderá ser ainda mais expressivo com a ampliação do terminal já existente.
O investimento será realizado com capital privado, prevendo-se um impacto económico direto superior a quinhentos milhões de euros, o que representa uma fração relevante do Produto Interno Bruto nacional. Estima-se a criação de mais de mil postos de trabalho diretos, com um impacto total, incluindo efeitos na logística e indústria associadas, superior a quatro mil empregos.
O terminal será desenvolvido segundo o modelo de concessão, em que a infraestrutura permanece sob titularidade pública, mas a operação é atribuída a um concessionário privado. Este modelo procura assegurar o equilíbrio entre controlo público e eficiência privada, permitindo compatibilizar a exploração económica com os requisitos ambientais e regulamentares.
O Terminal Vasco da Gama representa (…) uma oportunidade concreta para consolidar o papel do Porto de Sines no sistema portuário europeu e mundial.
A componente tecnológica do TVG será essencial para garantir níveis elevados de eficiência. Estão previstas soluções como o fornecimento de energia elétrica a navios atracados (cold ironing), substituição progressiva de maquinaria tradicional por equipamentos elétricos, automatização dos processos de movimentação e digitalização integral das operações.
Do ponto de vista ambiental, foram definidas medidas de mitigação dos impactos associados à construção e operação do terminal, incluindo barreiras de contenção, sistemas de monitorização subaquática e reaproveitamento de águas pluviais. Estão também planeadas intervenções ao nível da eficiência energética, com utilização de combustíveis alternativos, como o gás natural liquefeito, e instalação de painéis solares, contribuindo para os objetivos de neutralidade carbónica definidos no quadro europeu.
O crescimento da atividade portuária exigirá um aumento significativo da mão de obra qualificada. A resposta a esta necessidade passará por iniciativas de formação técnica, em articulação com entidades locais e regionais. Estão também previstas estruturas de acompanhamento e participação pública, que permitirão monitorizar o impacto do projeto e promover uma relação transparente e participativa com a comunidade envolvente.
A nova infraestrutura deverá reforçar a atratividade do porto para mega navios e operadores internacionais, promovendo a ligação com mercados em crescimento, desde que complementada por investimentos em acessibilidades terrestres e zonas logísticas de apoio. A competitividade do terminal dependerá da sua capacidade para oferecer condições operacionais fiáveis, eficientes e sustentáveis.
Ainda assim, subsistem desafios relevantes. A escassez atual de mão de obra especializada já condiciona o funcionamento das infraestruturas existentes e poderá agravar-se com a entrada em operação do novo terminal. Será igualmente necessário reforçar os serviços de apoio – como reboque, amarração, pilotagem, vigilância, alfândega e inspeção – bem como garantir a disponibilidade energética adequada para suportar o novo nível de atividade. A limitação de terrenos para expansão logística imediata nas imediações do porto poderá ser um obstáculo, caso o terminal evolua além da função de transbordo.
O Terminal Vasco da Gama representa, assim, uma oportunidade concreta para consolidar o papel do Porto de Sines no sistema portuário europeu e mundial. Para que este crescimento se traduza em desenvolvimento sustentável, será essencial assegurar a modernização das infraestruturas terrestres, o investimento na qualificação de recursos humanos, o cumprimento rigoroso dos compromissos ambientais e uma governação eficiente e transparente. O êxito deste projeto dependerá, em última análise, da capacidade de articulação entre o setor público, os operadores logísticos e a comunidade local.
Leonor Pinto, Maria Leonor Robalo, Matilde Matias e Afonso Ruas.
Alunos da ENIDH