Numa época de todos os Santos, vêm-me à memória alguns escritos em que falo dos astros estarem todos alinhados relativamente ao transporte ferroviário de mercadorias.
Cada vez mais me surpreendo porque raio é que não se alinham?, será porque Deus, Anjos e Santos, não conseguem vencer os Demónios? Ou, afinal, há algo mais?
No recente Dia do Transitário foi referido que o problema para não haver maior integração modal ferroviária, aparentemente não irá haver para já, é porque há players que não acreditam, as infraestruturas disponíveis não facilitam e o modelo de negócio não é o mais adaptado à realidade nacional.
Recentemente fomos surpreendidos com a decisão da transmissão do terminal rodo-ferroviário da IP de Leixões para a gestão da APDL, que, somado à anterior decisão sobre o Porto Seco da Guarda, poderá trazer lufadas de ar fresco à forma como temos vindo a tratar o transporte ferroviário de mercadorias em Portugal.
Eis senão que somos confrontados com a notícia de que a Linha da Beira Alta já não vai abrir quando estava previsto. Aparentemente há uma entidade que, em nome do ambiente. decidiu alterar o projeto inicial, e agora nem a IP arrisca a data de abertura. Estima-se, diz-se que será mais um ano. Bem…, eu, em nome do ambiente, diria que é mais um ano a ver passar os camiões (nada contra) e a ver os comboios parados.
Vamos esperar que não sejam alguns papéis, relatórios ou análises realizadas num qualquer gabinete que venham penalizar ainda mais a economia. Importa saber que há operadores já muito penalizados por esta alteração e se num momento até pensavam “aguentar” tudo em nome de mais e maior sustentabilidade e de um futuro melhor, hoje já estão deveras penalizados, já equacionam alternativas, pois não há dinheiro, especialmente quando não é público, que aguente tais desideratos.
…em nome do ambiente, diria que é mais um ano a ver passar os camiões (nada contra) e a ver os comboios parados.
Faz-me lembrar a história do Ambrósio, que no dia de todos os Santos foi à missa montado na sua bicicleta, já depois de provar várias “águas-pé”, ou seja, já com uns copitos. O trajeto aumentava para mais do dobro com tantas reviengas, voltas e voltaretas que dava para chegar ao destino com os custos diretos decorrentes. Terminada a missa, o padre olhou para o Ambrósio e disse-lhe – vai para casa em paz com Deus, Anjos e todos os Santos.
Ambrósio, depois de verificar as várias questões ambientais, de segurança, técnicas, físicas e pessoais, monta-se na bicicleta, anda meia dúzia de metros e cai. Levanta-se algo combalido, eleva-se na sua altivez de meio de transporte mais antigo e sustentável e comenta em alta voz: bem que avisei que não ia caber tanta gente na minha bicicleta e isto não ia dar bom resultado.
O Ambrósio é o caminho de ferro onde toda a gente parece querer mandar ainda, sem saber bem como.
A bicicleta é o comboio que anda às voltas e voltas e voltas, sem saber por onde circular, onde carregar e descarregar e como se tornar num parceiro de uma economia que se quer mais descarbonizada e mais amiga das gerações vindouras.
Refletir é como andar de bicicleta: requer esforço constante, não há “missa” decorada, tem que se manter o equilíbrio, se pararmos caímos e, quando se aprende, não mais se esquece.
ANTÓNIO NABO MARTINS
Especialista em ferrovia
Excelente artigo!
Os nossos governantes pensam que continuar a carregar o burro com fardos de palha só lhe faz bem porque sempre consegue mais um, mas com o burro cada vez mais lento e fraco o atraso na entrega aumenta.
Depois a culpa é sempre de quem colocou o último que fez burro cair, por não ter visto “condições de trabalho” do “parceiro” ou pior a culpa é de quem é dono do burro que deveria ter um mais robusto sempre adaptado às exigencies do transporte.
Talvez governo apoie a adaptação dos vagões e locomotivas para rodoferroviários e assim temos sempre possibilidade de ir por estrada quando não temos via!
Claro que último parágrafo é uma metáfora sobre o que temos de inventar para que plano possa seguir e utilizadores possam sobreviver.
Não falemos do transporte alternativo para passageiros, que concurso saiu após fecho da linha.
Que planeamento se faz no nosso belo país à beira-mar.
Envolvam técnicos e eliminem teóricos…
Deveriam pensar nisso.