A eficiência dos portos comerciais é vital para a economia marítima de Portugal. Uma das atividades mais críticas para garantir essa eficiência é a dragagem, que mantém os canais navegáveis, permitindo o trânsito seguro das embarcações e assegurando a competitividade dos portos.
Os custos de dragagem variam significativamente de ano para ano, dependendo da extensão das obras e das condições locais. Por exemplo, o porto de Hamburgo conseguiu reduzir os custos de dragagem em mais de 50% com a implementação do sistema Tiamat, que também reduziu as emissões de gases de efeito estufa em até 65%. No passado maio, o Porto de Aveiro abriu concurso público para dragagens no valor de 1,2 milhões de euros. Já o Plano Plurianual de Dragagens dos Portos de Pesca do Algarve 2024-2026 prevê um investimento de cerca de 8,5 milhões de euros.
Atualmente, os portos portugueses dependem de serviços terceirizados, resultando em altos custos e dependência de fornecedores externos e da mobilização da draga.
A proposta de aquisição conjunta de uma draga pelos portos comerciais portugueses surge volta e meia, mas é encarada com desdém ou ceticismo, muitas vezes devido ao histórico conhecido da DRAGAPOR. Criada pelo Decreto-Lei n.º 332/77, de 10 de agosto, a empresa enfrentou problemas de gestão, subfinanciamento e tecnologia desatualizada.
Acredito, no entanto, que nunca se realizou um estudo aprofundado sobre este assunto – mas desenganem-se se pensam que serei eu a providenciar esse mesmo estudo aqui. Deixo, e incentivo, essa tarefa para alguém mais qualificado.
Quero deixar aqui apenas algumas linhas de reflexão:
O que é uma dragagem?
A dragagem consiste na limpeza, desassoreamento, alargamento e remoção de material do fundo de rios, lagoas, mares e canais. Existem vários tipos de dragagem, como a ambiental, que remove sedimentos contaminados sem ressuspensão de contaminantes, e a de manutenção, que garante a profundidade adequada dos canais de navegação.
Os principais tipos de draga incluem as mecânicas, utilizadas para remoção de cascalho e sedimentos coesivos, e as hidráulicas, usadas para areia e silte pouco consolidado. As dragas de sucção, como aspiradoras e cortadoras, utilizam um bocal de aspiração para remover material. O material dragado pode ser sedimentado por meio de tecnologias como centrifugação ou tubos geotêxteis e transferido para locais de despejo autorizados.
Quem pode operar uma draga?
Para operar uma draga, é necessário um conjunto de trabalhadores especializados, incluindo capitão/mestre, engenheiro, operador, técnico de manutenção e oficial de navegação. Os custos anuais para esses trabalhadores em Portugal variam de €30.000 a €80.000. Para avaliar se as administrações portuárias podem manter este serviço internamente, é necessário considerar investimentos em infraestrutura, formação e desenvolvimento contínuo dos trabalhadores. O modelo de negócio pode incluir tanto a utilização interna quanto a oferta de serviços de dragagem a outros portos (estrangeiros).
Redução de Custos: uma perspetiva de longo prazo
É essencial realizar um estudo de viabilidade económica comparando os custos de operação interna com os de contratação de serviços externos. A posse de uma draga própria pode reduzir os custos anuais de €3.000.000 a €5.000.000 para cerca de €965.000, considerando vencimentos, manutenção e outros custos operacionais. A aquisição de uma draga conjunta pelos portos comerciais portugueses parece ser uma solução viável e economicamente vantajosa, desde que as lições do passado sejam levadas em conta. A redução de custos a longo prazo, a melhoria na eficiência operacional, a incorporação de tecnologias modernas e a capacidade de gestão e expansão tornam esta proposta recomendável.
Os custos anuais de dragagem para os portos portugueses podem totalizar milhões de euros. A contratação de serviços terceirizados, embora prática, é dispendiosa e sujeita a variações de mercado e à disponibilidade de fornecedores. Ao adquirir uma draga própria, os portos podem reduzir significativamente esses custos, eliminando a necessidade de procedimentos pré-contratuais, muitas vezes marcados por grande litigiosidade. Além de atender às necessidades internas, a posse de uma draga abre a possibilidade de oferecer serviços de dragagem a outros portos, gerando receitas adicionais e fortalecendo a posição competitiva dos portos portugueses no mercado internacional.
Primado das funções da autoridade portuária
As administrações portuárias devem assumir um papel central e proativo na gestão das suas infraestruturas, incluindo a execução de dragagens. Este papel é crucial para garantir condições de navegabilidade seguras e eficientes, diretamente relacionadas com a segurança marítima. A capacidade de realizar dragagens internamente reforça a autonomia das administrações portuárias, permitindo-lhes responder rapidamente a necessidades emergentes sem depender de terceiros.
A dragagem, como parte das funções de autoridade portuária, é um serviço de interesse público essencial para a segurança e operabilidade dos portos. Abrir a possibilidade a que estas funções possam estar em controlo público garante que os interesses da comunidade e da economia nacional sejam priorizados. A gestão pública da dragagem reflete o compromisso com o serviço público, assegurando que as operações são realizadas com um foco na segurança, eficiência e sustentabilidade.
Melhoria na eficiência operacional
Uma draga própria permitiria uma maior flexibilidade e controlo sobre as operações de dragagem. Os portos poderiam planear e executar dragagens conforme necessário, sem depender da disponibilidade de fornecedores terceirizados. Isso garantiria uma resposta mais rápida às necessidades emergentes e uma manutenção mais eficaz e contínua dos canais navegáveis. Além disso, a autonomia operacional permite que os portos ajustem imediatamente as suas atividades de dragagem em resposta às condições meteorológicas e ambientais, otimizando a segurança e a eficiência das operações portuárias.
Inovação tecnológica e sustentabilidade ambiental
Investir numa draga própria possibilita a incorporação de tecnologias avançadas. Métodos modernos, como a dragagem por injeção de água (WID), são mais eficientes e ambientalmente amigáveis. Tecnologias como o sistema Tiamat, que já demonstrou reduzir os custos de operação em até 50% e as emissões de gases de efeito estufa em até 65%, são exemplos claros dos benefícios da inovação, em que os portos devem apostar cada vez mais
Emprego jovem e qualificado
A aquisição conjunta de uma draga não só melhoraria a eficiência operacional dos portos, mas também tornaria as carreiras nas administrações portuárias mais atrativas. Investir em tecnologia moderna e métodos de dragagem inovadores cria um ambiente de trabalho estimulante, que atrai profissionais qualificados e entusiastas da inovação. A introdução de novas tecnologias e métodos de dragagem abre caminho para carreiras especializadas e tecnológicas dentro das administrações portuárias, proporcionando oportunidades para trabalhar com equipamentos de ponta e promovendo um ambiente de constante aprendizagem e desenvolvimento.
Em conclusão, a proposta de aquisição conjunta de uma draga própria pelos portos comerciais portugueses parece ser uma solução viável e economicamente racional, desde que as lições do passado sejam consideradas. A redução de custos a longo prazo, a melhoria na eficiência operacional, a incorporação de tecnologias modernas e a capacidade de gestão e expansão tornam esta proposta atrativa.
Além disso, a criação de novas oportunidades de emprego permite às administrações portuárias atrair jovens talentos, contribuindo para o rejuvenescimento dos seus quadros e garantindo a continuidade e a inovação no setor portuário. As novas funções associadas à operação de uma draga moderna são exemplos de “greens jobs”, promovendo a sustentabilidade e a inovação. Estes empregos não só beneficiam o meio ambiente, mas também atraem uma geração que valoriza práticas ecológicas e sustentáveis. Implementar esta medida pode ser uma estratégia eficaz para fixar jovens profissionais em Portugal, oferecendo empregos estáveis e inovadores e tornando as administrações portuárias atrativas para jovens que buscam oportunidades de desenvolvimento profissional no seu próprio país.
Mas… e a União Europeia deixa?
Dentro das regras estabelecidas pela União Europeia, é perfeitamente viável que uma administração portuária, portanto uma empresa pública no cenário português, opere dragas diretamente. A política europeia de livre concorrência e mercado único promove a acessibilidade equitativa dos serviços portuários a todas as entidades competentes, mas não impede a operação direta de dragas pelas autoridades portuárias públicas. A Diretiva 2014/25/UE e o Regulamento2017/352 preceituam a adjudicação de contratos nos setores portuários e estabelecem um quadro para a prestação de serviços portuários, assegurando que as administrações portuárias possam oferecer esses serviços diretamente, desde que respeitem os princípios de não discriminação, transparência e concorrência justa.
Para que uma administração portuária pública opere uma draga é crucial garantir total transparência nas operações e contratos, e cumprir com as normas de contratação pública, como a realização de concursos públicos para a aquisição de equipamentos e serviços associados. Justificações como a falta de prestadores de serviços qualificados, a necessidade de resposta rápida a emergências, ou a manutenção de altos padrões de segurança e ambientais, podem ser usadas para argumentar a favor da gestão interna das operações de dragagem. Dessa forma, as administrações portuárias podem assegurar que as suas operações de dragagem são eficientes e em conformidade com os regulamentos da União Europeia, garantindo ao mesmo tempo que o interesse público seja plenamente cumprido.
Em conclusão, a proposta de aquisição conjunta de uma draga própria pelos portos comerciais portugueses parece ser uma solução viável e economicamente racional, desde que as lições do passado sejam consideradas. A redução de custos a longo prazo, a melhoria na eficiência operacional, a incorporação de tecnologias modernas e a capacidade de gestão e expansão tornam esta proposta atrativa.
Com uma gestão competente e um plano financeiro sólido, os portos portugueses podem otimizar as suas operações internas e até explorar novas oportunidades de mercado, contribuindo para um crescimento sustentável e competitivo da economia marítima nacional.
A aquisição de uma draga própria é mais do que uma estratégia financeira; é um investimento no futuro dos portos portugueses e na eficiência do comércio marítimo nacional.
Nota: Os custos operacionais anuais estimados para a operação de uma draga própria pelos portos comerciais portugueses são baseados numa combinação de salários para trabalhadores especializados e despesas de manutenção e operação da draga. Estas estimativas são baseadas em faixas salariais médias para profissionais com a qualificação e experiência necessárias para operar e manter uma draga. Salários podem variar dependendo do mercado e da localização específica, mas estes valores são representativos para profissionais especializados no setor marítimo em Portugal.
Mestre em Gestão Portuária, pela Escola Náutica Infante D. Henrique
Boa tarde.
Permita-me discordar!
Mais empresas públicas, não muito obrigado!
O Contribuinte Português já paga demasiado para ter coisas a funcionar mal!
Sugestão:
Compre uma draga e …. E depois diga-nos como foi!
Melhores Cumprimentos
Cidadão Pagador de Impostos.
Caro Cidadão.
Em princípio, cidadão pagador de impostos seremos todos. Em segundo lugar, com certeza que permito discordar. Só gostava que fosse mais específico quanto à discordância – até para eu perceber e eventualmente afinar alguma coisa que me esteja a falhar. Dito isto, onde no artigo refiro a criação de mais empresas públicas? O que digo, e nem sequer é uma novidade minha, é que há maneiras de gerar sinergias e melhor aproveitamento de recursos, no caso específico, sobre dragagens.
Obrigada.