MSC vs. Maersk Line
Fundada em 1970, por Gianluigi Aponte (Capitão da Marinha Mercante), a MSC iniciou a sua atividade com um único navio de carga. No dia 5 de janeiro de 2022, 52 anos após a sua fundação, a MSC assumiu a liderança mundial, em termos de capacidade, no mercado do transporte marítimo de carga contentorizada.
Tratou-se de um dia histórico no shipping. A MSC destronou a liderança de 23 anos da Maersk Line, empresa de cariz secular, fundada em 1886 pelo também Capitão da Marinha Mercante, Peter Maersk Moeller. Desde 1999, após a aquisição da Sealand (empresa do mítico Malcolm McLean – criador do processo de contentorização), este título era propriedade da Maersk Line.
Com uma agressiva estratégia de crescimento, assente na aquisição de outros operadores marítimos, a quota de mercado da Maersk assumiu o valor de 18,2%, em agosto de 2005 (momento da aquisição da P&O Nedlloyd), enquanto a MSC apenas representava 8,2%.
Em 2017, perante o sucessivo aumento do “market share” da MSC, a Maersk adquiriu a Hamburg Sud (especializada nos tráfegos N/S, com particular enfoque no Continente Sul-Americano). Com esta aquisição, a Maersk chegou a deter quase 19% de quota de mercado, contra 14,6% da MSC, sua parceira na Aliança 2M.
A 1 de janeiro de 2024, a MSC tinha uma frota de 799 navios, com uma capacidade de carga de 5,608 milhões de TEU (19,8% quota de mercado). A Maersk Line, destronada da liderança, tinha 675 navios, representando 4,116 milhões de TEU (14,5% quota de mercado)
Soren Soft, atual CEO da MSC e anteriormente líder da Maersk Line, deu seguimento à estratégia de crescimento endógeno (através de aquisições de navios em 2.ª mão, novas encomendas em estaleiro e afretamento de navios) iniciada pelo Chairman da MSC.
O crescimento inicial da MSC esteve associado à visão do seu líder, Aponte, na compra e venda de navios. Apenas em 1994 a MSC encomendou o seu primeiro navio novo, em estaleiro. Até então, toda a sua frota tinha sido adquirida em 2.ª mão.
Curiosamente, no período compreendido entre 2020 e 2024, volta a ser a aquisição de navios em 2.ª mão a alicerçar o crescimento na capacidade da frota da MSC. Foram adquiridos centenas de navios em 2.ª mão, alguns dos quais são navios com contratos de afretamento válidos com a própria MSC. Na gíria do mercado, a MSC compra todos os navios porta-contentores, independentemente da dimensão ou idade. Com o mercado em alta, associado às sucessivas disrupções nas cadeias de abastecimento, “tudo o que flutue e transporte contentores, dá dinheiro”.
Em paralelo, é também o operador marítimo com a maior carteira de encomendas de novos navios. A mesma ascende a 1,472 milhões de TEU (dados de 1 de janeiro de 2024).
A participação da MSC no capital da TIL (Terminal Investment Limited) e os acordos preferenciais, à escala internacional, que estabelece com a PSA – “Port of Singapore Authority”, também lhe conferem relevância na área da operação portuária.
O próximo passo da MSC, após consolidar a sua liderança no mercado, é seguir a estratégia de integração da cadeia de abastecimento da Maersk, tendo realizado ofertas públicas de aquisição sobre o Grupo Bolloré-Africa (especializado na operação portuária) e sobre a Log-In Logistica-Brasil.
20 Maiores Operadores Marítimos de Carga Contentorizada
(1 de janeiro de 2024)
Relativamente à estratégia de crescimento da Maersk, de acordo com Vincent Clerc, o novo líder da Maersk, o objetivo da empresa não é ser o maior operador marítimo mundial, mas sim o mais rentável. Para isso, considera que a Maersk deve deixar de ser um mero transportador marítimo e assumir-se como um grande integrador global (“freight integrator”).
Para alcançar esse objetivo, a Maersk tem seguido um programa de expansão da sua frota mais conservador. Após ter sido após ter sido a empresa precursora em 2013 dos navios de 18.000 TEU – “Triple E”, atualmente a Maersk apenas tem 37 novos navios em encomenda, que representam 458 mil TEU. Oito desses navios são navios de 16.000 TEU a metanol, num negócio avaliado em 1,4 mil milhões de dólares.
De acordo com o seu CEO, a Maersk infletiu a sua estratégia de crescimento, passando de um modelo do tipo “aggressive growth”, para um modelo do tipo “growth with the market”, assegurando uma expansão da frota em linha com o crescimento do mercado, mantendo a sua quota de mercado estável nos 15%, e apostando estrategicamente noutras áreas de maior valor acrescentado na cadeia de abastecimento.
Uma dessas áreas é a operação portuária. A APM Terminals é propriedade do Grupo Maersk, sendo o 3.º maior operador portuário a nível global. Isso traduz bem a nova filosofia da APM: a Maersk não quer apenas movimentar contentores de um porto para outro; quer ter uma proposta de valor atraente para os seus clientes, nomeadamente fazendo parte integrante de soluções logísticas “end-to-end”.
Algo que lhe tem trazido dissabores no mercado. Os grandes clientes da Maersk questionam se a mesma não se está a tornar num concorrente dos seus próprios clientes ao procurar entrar em novas áreas de valor da cadeia de abastecimento. Exemplo disso é a DB Schencker que decidiu romper a tradicional ligação com a Maersk e recorrer ao serviço da MSC para a vertente de distribuição marítima.
Integração da Cadeia de Abastecimento
Adaptado pelo autor, a partir de informação da BRS – Alphaliner, 2024
CMA-CGM vs. COSCO
Também para o posto de 3.º operador marítimo mundial de carga contentorizada a “luta” é acesa. A CMA CGM continua com um ambicioso programa de expansão e renovação da sua frota, apostando decididamente no LNG para a reformulação do paradigma energético no transporte marítimo (IMO 2020).
A frota da CMA-CGM (França) tem evidenciado um significativo crescimento na capacidade de carga, alicerçado na entrega novos navios de 23.100 TEU e de navios de 15.000 TEU movidos a LNG (dual-fuel).
A 1 de janeiro de 2024, operava uma frota de 625 navios, com uma capacidade de 3.578 milhões de TEU, e é o terceiro maior operador marítimo mundial de carga contentorizada.
Em 1996 Jacques Saadé adquiriu a CGM (Compagnie Générale Maritime) no decurso do seu processo de privatização. Empresário Francês de ascendência Libanesa, com uma profunda visão para o sector, rapidamente iniciou uma agressiva política de aquisições e fusões, visando tornar a CMA CGM um dos maiores operadores marítimos mundiais.
Apesar de visionário, Jacques Saadé não conseguiu prever a intensidade da crise que abalou o “shipping” a partir de Outubro de 2008. A estratégia de crescimento, através de fusões/aquisições, implicou um elevado sobre-endividamento da CMA CGM.
Perante a falta de liquidez para solver os seus compromissos, solicitou uma linha de crédito ao Governo de França, bem como a renegociação da dívida com os seus credores.
As fortes ligações ao mundo Árabe de Jacques Saadé (recorde-se a sua ascendência Libanesa), permitiram a entrada do Grupo Familiar Yildirim (Turquia), no capital da CMA CGM, em 2010. Adquirindo 20% do capital da CMA CGM, o Grupo Yildirim injetou 500 milhões de dólares que foram muito importantes para solver os compromissos de curto prazo da empresa.
A recuperação do mercado do shipping, aliada à injeção de capital do Grupo Yildirim, permitiu o início da recuperação financeira da CMA CGM. Presentemente, a CMA CGM tem 110 encomendas de novos navios em estaleiro, representando uma capacidade de carga de 1.198 milhões de TEU (a 2.ª maior carteira de encomendas logo atrás da MSC). A prazo, em função da carteira de encomendas, é previsível que ultrapasse a Maersk e se venha a assumir como o número 2 no mercado do transporte marítimo de carga contentorizada. Também marca presença relevante na operação portuária, sendo o 8.º maior operador portuário a nível mundial.
A CMA CGM tem igualmente estado no centro da política de Alianças Estratégicas no sector. Como resposta à sua exclusão da P3 e constituição da 2M, a CMA assumiu a liderança da “Ocean Alliance”, com os Chineses da COSCO (que tinham adquirido a OOCL) e a Evergreen (Taiwan). Trata-se de uma das Alianças mais dinâmicas no mercado do “shipping”.
Em 2016, a COSCO e a China Shipping (maiores empresas de transporte marítimo chinesas) fundiram-se numa única empresa. O modelo tradicional da China, em que as empresas são propriedade do Estado e seguem uma lógica concorrencial entre si, não estava a conseguir ser competitivo face aos grandes operadores marítimos mundiais de carga contentorizada.
A dimensão tornou-se um fator crítico de sucesso no mercado do transporte marítimo de carga contentorizada e as sinergias entre ambos os operadores eram por demais evidentes. A começar pelo facto de ambos serem maioritariamente propriedade do mesmo acionista, o próprio Estado da China. Muitos analistas de mercado consideraram mesmo que subjacente à não aprovação da Aliança P3 por parte das Autoridades da Concorrência da China estava uma lógica protecionista de defesa dos operadores marítimos chineses.
Em 2018, numa procura incessante por economias de escala, a COSCO adquiriu igualmente a Orient Overseas Container Lines (OOCL), numa operação avaliada em 6,3 mil milhões de dólares. Nessa data, a COSCO assumiu-se como o 3.º maior operador marítimo de carga contentorizada, logo atrás da MSC e da Maersk.
Em janeiro de 2024, a carteira de encomendas em estaleiro da COSCO ascendia a 837,5 milhares de TEU (27,4% da capacidade da sua frota atual). Destacam-se 12 encomendas de navios dual-fuel (metanol) de 24.000 TEU, com um valor unitário de aquisição de 240 milhões de dólares.
Concentração da Operação Portuária
Atualmente a COSCO, tem-se centrado na vertente da operação portuária (na qual destronou a PSA como maior operador portuário mundial), pelo que voltou a ser ultrapassada pela CMA CGM que continua com um ambicioso programa de expansão e renovação da sua frota. A CMA CGM recuperou, assim, o lugar de 3.º maior operador de transporte marítimo de carga contentorizada à escala mundial, lugar que tradicionalmente sempre foi seu.