Em Janeiro de 2024, a Maersk voltou a revolucionar o tradicionalmente conservador mercado do shipping, através do batismo do navio “Anne Maersk”.
Trata-se do primeiro navio de 16.000 TEU movido a metanol (dual-fuel) a nível mundial. É um navio com 349 metros de comprimento “fora-a-fora” e 54 metros de boca.
Ao contrário das tendências anteriores no mercado do transporte marítimo de carga contentorizada, a ênfase não está nas economias de escala (redução do custo unitário de transporte por aumento da dimensão do navio). Os maiores navios do mundo atualmente ascendem aos 24.346 TEU. Esse paradigma esteve associado à necessidade de redução de custos, para ser competitivo no mercado global, quando os fretes marítimos assumiam valores muito reduzidos (período pré-pandemia).
O enfoque agora, no início de 2024, com o mercado caracterizado pela disrupção das cadeias de abastecimento, pelos fretes elevados, pela falta de fiabilidade dos serviços e pelo congestionamento portuário, está na maximização da capacidade de carga, tendo em consideração as dimensões do navio, visando especialmente, a otimização do ritmo de carga/descarga e da operação portuária.
Mais uma vez, a Maersk, com um design arrojado, promete determinar a evolução no sector. A ponte e os alojamentos avançaram totalmente para vante do navio. A máquina principal, os depósitos de combustível e a chaminé recuaram para ré. Mais, a chaminé está confinada a meio navio (lado bombordo).
Na prática, o navio visa materializar o conceito de rendimento teórico de um pórtico (tradicionalmente 33 a 35 TEU/hora). Este valor é calculado teoricamente, considerando um bloco homogéneo de contentores, sem descontinuidades. No novo navio da Maersk, o rendimento efetivo aproxima-se do rendimento teórico da superestrutura portuária. O navio assume-se como um bloco homogéneo de contentores, sem qualquer tipo de descontinuidades que reduzam o ritmo e a eficiência da operação portuária.
Torna-se possível operar com 5 pórticos em simultâneo, atingindo ritmos de carga/descarga próximos dos 150 TEU/hora. Em paralelo, permite o recurso a um pórtico de menor alcance da lança, para operar os contentores mais a ré (a chaminé está confinada a BB do navio).
A opção pelo metanol verde também é disruptiva no sector do transporte marítimo de carga contentorizada. A Maersk considera que ainda é cedo para definir o novo paradigma energético, pelo que é prematuro avançar com encomendas em série em estaleiro quando não é claro qual a fonte energética do futuro. O LNG será necessariamente uma fonte energética de transição. Como alternativa, aposta no metanol verde, a título experimental, nas novas encomendas efetuadas.
O metanol verde é biodegradável (o que se torna muito importante em caso de poluição marinha), tem 0% de emissões de enxofre e de nitrogénio e reduz substancialmente as emissões de CO2 relativamente ao diesel convencional (que apresenta um teor de 0,5% SOx). O custo de conversão para o metanol é muito mais baixo do que para o LNG.
Como limitações, apresenta a necessidade de maior área de tancagem/armazenamento (a sua eficiência energética é menor), um baixo ponto de ignição e uma elevada toxicidade. É igualmente corrosivo a nível dos encanamentos, tanques de combustível e máquina do navio.
Apesar de ser ainda prematuro tirar conclusões, parece-nos claro que, quer a nível de design, quer a nível de ritmos de carga/descarga, quer a nível da propulsão, as novas encomendas da Maersk serão a norma para o futuro.
A MSC assumiu-se como o maior operador marítimo mundial de carga contentorizada, tornando-se líder destacado em termos da capacidade da frota. A Maersk Line continuará a ser dominante na inovação e na definição das tendências futuras no mercado do transporte marítimo de carga contentorizada.
FERNANDO CRUZ GONÇALVES
Professor da Escola Superior Náutica Infante D. Henrique
Excelente texto.