A iniciativa decorre do “European Green Deal”, em que a Comissão Europeia fixou metas ambientais para a UE, entre as quais os bem conhecidos objetivos de neutralidade carbónica até 2050 e a de redução em, pelo menos, 55% das emissões de gases com efeito de estufa até 2030 (em comparação com os níveis de 1990).
Justificado pelo objetivo de combate à fuga de carbono – que ocorre quando a produção de bens é transferida para países com normas climáticas menos rigorosas, ou quando são importadas dessas geografias mercadorias que, de outro modo, seriam adquiridas na UE –, o CBAM substituirá gradualmente o atual mecanismo de tributação das emissões de carbono, o CELE (ou ETS-EU em inglês), e as licenças de emissão gratuitas ao abrigo do mesmo, procurando nivelar o campo de atuação para as indústrias europeias.
Embora esteja em vigor desde o passado dia 17 de maio, numa primeira fase, o CBAM só será aplicável a partir de 1 outubro, em importações para a UE que incidam sobre um leque determinado de produtos considerados de elevada intensidade de carbono, a saber: cimento, eletricidade, ferro e aço, alumínio e produtos químicos (hidrogénio) – incluindo os produtos transformados resultantes de aperfeiçoamento ativo.
Concomitantemente, a partir de outubro, essas mercadorias só poderão ser introduzidas em livre prática na União por um declarante CBAM autorizado, que poderá ser o próprio importador ou o seu representante aduaneiro indireto, desde que este último aceite a responsabilidade da apresentação dos relatórios exigidos ou quando o importador não estiver estabelecido na UE.
A jusante, o importador ficará obrigado à emissão anual da “Declaração CBAM”, verificada por um Verificador Autorizado, e que deverá incluir:
– a quantidade total para cada tipo de mercadoria importada durante o ano civil precedente (expressa em megawatt-hora para eletricidade e em toneladas para outras mercadorias);
– o total das emissões incorporadas nessas mercadorias (expressas em toneladas de dióxido de carbono equivalente (CO2e) por megawatt-hora para eletricidade ou, para outras mercadorias, em toneladas de emissões de CO2e por tonelada de cada tipo de mercadoria);
– informações sobre o preço do carbono pago no país terceiro de origem, cuja jurisdição aplique preços de carbono comparáveis aos do CELE (o que, a partir de 2026, permitirá ao importador requerer a respetiva dedução nos certificados CBAM entregues); e
– cópias dos relatórios de verificação emitidos pelos verificadores acreditados.
Os declarantes CBAM autorizados terão que adquirir os certificados CBAM (correspondentes ao preço do carbono que teria sido pago se as mercadorias tivessem sido produzidas de acordo com as regras de precificação de carbono da UE) no Estado-Membro em que se encontrem estabelecidos e poderão dispor dos mesmos, seja recorrendo à sua devolução, à sua recompra ou à sua anulação. Contudo, o sistema de compra dos certificados CBAM só entrará em vigor a partir de 1 de janeiro de 2026, altura em cessa o período de transição.
[Os declarantes CBAM autorizados] deparam-se, não apenas com a insuficiência de ações de informação junto dos stakeholders (quando a entrada em aplicação do diploma está já próxima), mas, essencialmente, com o nível de dados e as dificuldades práticas que se preveem no apuramento inequívoco das informações exigidas.
Até 31 de dezembro de 2025, estaremos perante um período transitório em que, conforme o disposto no artigo 32.º do regulamento, as obrigações do importador limitar-se-ão somente às obrigações de comunicação de informações, nos termos dos artigos 33.º, 34.º e 35.º do mesmo diploma. Ou seja, à apresentação do designado “relatório CBAM” à Comissão, relativo às mercadorias importadas num determinado trimestre de um ano civil, o mais tardar, até ao final do mês subsequente, com os seguintes requisitos de conteúdo:
– a quantidade total de cada tipo de mercadoria (expressa em megawatt-hora para eletricidade e em toneladas para as outras mercadorias) especificada por instalação de produção das mercadorias no país de origem;
– o total de emissões reais incorporadas (expressas em toneladas de emissões de CO2e por megawatt-hora de eletricidade ou, para outras mercadorias, em toneladas de emissões de CO2e por tonelada de cada tipo de mercadoria);
– o total de emissões indiretas;
– e o preço do carbono devido num país de origem pelas emissões incorporadas nas mercadorias importadas, tendo em conta quaisquer descontos ou outra forma de compensação disponível.
Destas novas obrigações, ficarão isentas as mercadorias importadas em contexto militar, ou as consideradas de valor insignificante (as de €150 por remessa, nos termos do artigo 23.º do Regulamento (CE) n.º 1186/2009, do Conselho), ou as contidas nas bagagens e de valor insignificante e, ainda, as originárias da Islândia, Liechtenstein, Noruega e Suíça (uma vez que estes países já adotaram ou estão vinculados ao EU ETS) ou dos demais territórios indicados no anexo III do regulamento.
Aqui chegados, facilmente se antecipam algumas das preocupações suscitadas pelos futuros declarantes CBAM autorizados.
Enquanto futuros responsáveis pelas imprecisões ou incompletudes dos relatórios CBAM (cujas regras e procedimentos ainda estão para ser alvo de maior especificação em ato de execução a adotar pela Comissão nos termos do artigo 290.º, do TFUE), deparam-se, não apenas com a insuficiência de ações de informação junto dos stakeholders (quando a entrada em aplicação do diploma está já próxima), mas, essencialmente, com o nível de dados e as dificuldades práticas que se preveem no apuramento inequívoco das informações exigidas. Isto quando o incumprimento dos ditames obrigacionais será alvo de um regime sancionatório próprio.
Nesta senda, embora num recente webinar dedicado, promovido pela CLECAT, um representante da DG TAXUD tenha assegurado que o foco inicial será mais pedagógico do que punitivo, receia-se que tal entendimento não seja acolhido uniformemente por todas as autoridades competentes dos Estados-Membros UE, tornando-se pernicioso para o comércio internacional, já sobejamente fustigado no decurso dos últimos anos por diversos outros constrangimentos a nível global.
Ademais, está em curso uma reforma aduaneira, cujo alcance justifica, de per si, uma abordagem específica e particularizada e o simultâneo acompanhamento pelo setor.
Por fim, não será demais frisar que, tal como resulta do próprio preâmbulo do regulamento CBAM, a clareza, a previsibilidade e a segurança jurídicas a longo prazo se mostram essenciais à tomada de decisão das empresas em matéria de investimento na descarbonização dos respetivos processos industriais. Ao que acrescentaria a respetiva competitividade, bem como a eficiência e fluidez das cadeias globais de abastecimento de que o comércio internacional, assim como toda a economia adjacente, dependem.
INÊS SIMÕES CARNEIRO
Responsável Regional Norte – APAT