O contentor é hoje, sem dúvida, o maior protagonista do processo de globalização da economia. Assumiu-se como a verdadeira “caixa que mudou o mundo”. A unitização da carga desvalorizou o factor distância e promoveu as trocas comerciais à escala global.
Há 65 anos, no dia 26 de Abril de 1956, o navio “Ideal X” (um navio petroleiro da Segunda Guerra Mundial), adaptado para navio porta-contentores, com 16.600 DWT, iniciou uma viagem entre Newark e Houston com 58 contentores de alumínio de 35′ no convés e 15.000 toneladas de petróleo nos tanques de carga. Nunca mais nada seria como dantes no transporte marítimo.
O empreendedor? Malcolm Mclean. Como todos os empreendedores, alguém que pensava “out of the box” e que não estava directamente relacionado com a actividade marítima. Um pequeno transportador rodoviário que se saturou de passar noites ao relento em filas intermináveis a aguardar o embarque do algodão que transportava nos seus camiões. O embarque era feito às costas dos estivadores pelo portaló dos navios. Muitas vezes o navio passava mais tempo em porto em operações de carga/descarga do que a navegar. Eram frequentes estadias superiores a oito dias em porto.
Não seria mais fácil carregar directamente toda a galera para bordo do navio? Sim, era. E muito mais barato e rápido. Depois era só resolver o problema dos rodados e do reboque. Assim nasceu o contentor de 35′. Os custos da operação portuária (estiva) passaram de 5,83 USD/Ton movimentada para apenas 0,16 USD/Ton. A operação de carga e descarga era assegurada por meios próprios do navio (navios auto-portantes com gruas próprias).
Os ganhos de eficiência da operação portuária assustaram os sindicatos de estiva que procuraram combater esta inovação tecnológica. Em poucos anos as necessidades de mão-de-obra nas docas dos EUA diminuíram 70%.
Perante a resposta corporativa da estiva, como em todas as inovações, um factor foi determinante para o sucesso da contentorização: a guerra do Vietname. O Exército dos EUA precisava não só de um meio de transporte, mas também de um meio de armazenagem do equipamento militar em território inóspito e hostil. O contentor era a resposta certa para esta necessidade.
O futuro da contentorização? Não temos resposta. Na nossa opinião, iremos caminhar para o “contentor descartável” que será inutilizado no final do processo de transporte.
O processo de transferência modal (navio/ camião/ ferrovia) foi igualmente determinante para o sucesso da contentorização. O conceito de intermodalidade, ou seja, o transporte de uma mercadoria usando diferentes modos de transporte sem ruptura da unidade de carga assumiu foros de cidadania.
O processo de contentorização nunca mais parou. E a procura incessante de economias de escala também não (redução dos custos unitários de transporte por aumento da dimensão da unidade de transporte).
Dos 58 contentores do “Ideal X” (1956), evoluímos, 65 anos depois, para navios porta-contentores com a dimensão máxima de 23.756 TEU – MSC Gulson – Abril de 2021.
O futuro da contentorização? Não temos resposta. Na nossa opinião, iremos caminhar para o “contentor descartável” que será inutilizado no final do processo de transporte. Esta solução daria resposta a um dos grandes problemas do transporte marítimo de carga contentorizada, o desequilíbrio nas trocas comerciais e a necessidade de reposicionamento dos contentores vazios. A escassez e assimetria no posicionamento de contentores vazios é, aliás, o motivo apresentado para o “pico” no mercado de fretes que estamos a vivenciar presentemente.
Conceptualmente parece um modelo quase perfeito. O problema é que os custos de produção de um contentor ainda não permitem que seja economicamente viável a sua inutilização no final do processo de transporte. A “caixa que mudou o mundo” ainda está para ficar nos seus moldes tradicionais.
FERNANDO CRUZ GONÇALVES
Professor na ENIDH