A história molda as nossas memórias, e compreendê-la é essencial para tomarmos decisões fundamentadas sobre o futuro. No caso da Plataforma Logística do Poceirão, importa refletir sobre os factos que, desde 2009, têm sustentado a relevância deste projeto e a sua pertinência no contexto atual. Como defensora do Porto de Setúbal e de todas as iniciativas que possam promover o seu desenvolvimento, acredito que devemos avaliar a viabilidade deste empreendimento, com base em argumentos válidos e bem sustentados.
Regressemos, a 2009. Na altura, desempenhava funções como consultora na LOGZ – Atlantic Hub S.A., conhecida como a Plataforma Logística do Poceirão. Este consórcio era composto pela OIL (grupo Odebrecht), TERTIR (grupo Mota-Engil), Espírito Santo Properties (grupo Espírito Santo, atualmente BES), OPWAY e Sociedade Agrícola de Rio Frio (Grupo Londimo). Nesse período, a Takargo, então detida pela Mota-Engil, adquiriu os primeiros equipamentos para teste e realizou operações de exercício num pequeno ramal, parte do que seria a futura plataforma.
Os escritórios provisórios da LOGZ estavam situados na estação ferroviária do Pinhal Novo, onde uma maquete ilustrava a antevisão do que seria uma futura cidade logística.
O objetivo era claro: estabelecer uma ligação eficiente ao Porto de Setúbal e a Madrid, criando espaços logísticos para a instalação de pequenas e médias unidades fabris, promovendo simultaneamente um grande centro logístico. As ligações necessárias já estavam previstas na rede.
Naquela época, a Plataforma do Poceirão integrava a Rede Nacional de Plataformas Logísticas do Programa Portugal Logístico.
Um estudo de impacto ambiental, datado de 2009, identificou vários fatores determinantes para a concretização da plataforma, entre os quais:
- Centralidade geográfica em relação ao território continental português;
- Localização estratégica nos eixos de distribuição Norte-Sul e Este-Oeste da Península Ibérica;
- Proximidade à Grande Área Metropolitana de Lisboa (GAML);
- Acessos rodoviários e ferroviários privilegiados, permitindo uma ligação rápida e eficaz às principais estruturas de transporte nacionais;
- Condições geográficas e estruturais favoráveis para conferir um carácter multimodal à plataforma;
- Condições topográficas adequadas e ausência de impactos significativos em áreas protegidas ou classificadas, como REN e RAN;
- Existência de infraestruturas essenciais (eletricidade, gás) já construídas.
A Plataforma Logística do Poceirão (PLMP) visava promover a intermodalidade dos diferentes meios de transporte, uma visão avançada para a época. Pretendia-se que a plataforma fosse equipada com infraestruturas rodoferroviárias para apoiar os portos de Lisboa, Setúbal e Sines, tornando-se simultaneamente um centro de excelência para a distribuição e capaz de potenciar o crescimento das transações logísticas, não só na área metropolitana de Lisboa, mas também a nível nacional e internacional.
Esta cidade logística previa ainda gerar até 12 mil postos de trabalho, dos quais 5 mil diretos, fortalecendo assim a economia local e nacional.
Perspetivas Recentes
Agora, em 2024, quinze anos depois, é essencial refletir sobre o que está em jogo. Estamos a falar de 600 hectares já projetados, com processos que podem ser atualizados, certamente a um custo inferior comparado a novos estudos para outras soluções.
Consideremos também a proximidade ao novo aeroporto de Alcochete, a apenas 10 quilómetros do Poceirão, e a passagem da linha de alta velocidade Lisboa-Madrid, pelo Pinhal Novo, a seis quilómetros da plataforma, reforçando ainda mais a sua posição como um hub logístico multimodal.
Estamos a falar de 600 hectares já projetados, com processos que podem ser atualizados, certamente a um custo inferior comparado a novos estudos para outras soluções.
Além disso, espera-se a deslocalização de alguns terminais portuários de Lisboa para Setúbal, o que torna lógico que a oferta logística adjacente, como a da Bobadela, também se deslocalize, acompanhando a carga e os respetivos operadores para o Poceirão, longe do estrangulamento de Lisboa e com uma capacidade de hinterland quase infindável e eficiente para toda a Península Ibérica.
A Plataforma dista 19 quilómetros da área de jurisdição do Porto de Setúbal, com excelentes acessibilidades.
Outro ponto a salientar é a preocupação com a sustentabilidade ambiental. A plataforma foi desenhada para minimizar o impacto ambiental, priorizando o transporte ferroviário sobre o rodoviário, o que contribui para a redução das emissões de carbono. Foram realizados na altura estudos ambientais que visavam garantir que o projeto não afetasse negativamente as áreas protegidas, e que obviamente carecem de atualização.
Desafios e oportunidades futuras
Existem ainda desafios, nomeadamente a necessidade de integrar plenamente a plataforma nas redes logísticas europeias e maximizar a sua capacidade intermodal. No entanto, as oportunidades superam os desafios, especialmente com a possível deslocalização de terminais portuários de Lisboa para Setúbal e a consequente necessidade de novas soluções logísticas, como já referido anteriormente.
De referir ainda a importância da interligação e articulação com o futuro terminal ferroviário que está a ser construído no Entroncamento, e que expectavelmente abrirá portas até ao final do presente ano, denominado: OJE Logistics,
Em conclusão, o futuro da Plataforma Logística do Poceirão parece promissor, com um papel central no desenvolvimento logístico de Portugal, devendo ainda ser tida em linha de conta a ligação a outras plataformas logísticas e a sua integração nas redes de transporte internacionais. Este é, sem dúvida, um projeto que continuará a influenciar positivamente a economia e a infraestrutura logística do país nos próximos anos.
No mínimo, não descuraria a hipótese de regressar à analise deste projeto, adequando-o à realidade e às necessidades atuais.
FERNANDA NUNES FERREIRA
Artigo pertinente. Faço notar que Poceirão está incluido na lista de terminais rodoferroviários do regulamento 1679 das redes interoperáveis TEN-T na rede “core” com o objetivo 2030. Nada impede, do ponto de vista jurídico e racional, que se desenvolvam os anteprojetos e as candidaturas para os fundos comunitários. Apenas observo que apesar do estrangulamento referido, deverá ser conservada parte da plataforma de Bobadela (também incluida no 1679) e, eventualmente, Castanheira do Ribatejo.
Parece-me difícil, visto que maior parte desses terrenos já forma ocupados com culturas agrícolas (laranjeiras e abacateiros) e a restante área está destina à instalação de uma central fotovoltaica, pelo que não vejo como se possa voltar a pensar na PLP nesse local.