Os portos são muito mais do que simples pontos de entrada e saída de mercadorias; são motores de crescimento económico, conectividade global e plataformas de inovação.
O seu papel como elos centrais nas cadeias logísticas globais tornou-se ainda mais crítico num mundo marcado pela crescente interdependência entre países e regiões. Contudo, enfrentam desafios significativos, desde a adaptação a novas tecnologias e regulamentações ambientais até à necessidade de estabelecer relações harmoniosas com as comunidades que os rodeiam. Importa fazer uma análise profunda sobre o estado atual e as perspetivas futuras dos portos, identificando estratégias que podem assegurar a sua relevância e competitividade num panorama global em rápida transformação.
Nos últimos anos, as rotas comerciais globais sofreram uma reconfiguração profunda. A guerra na Ucrânia e as tensões geopolíticas em várias partes do mundo obrigaram a um redireccionamento estratégico do comércio marítimo, com destaque para o reforço das rotas Sul-Sul e o aumento de iniciativas como o nearshoring e o friendshoring. Estes movimentos refletem a necessidade de maior resiliência e flexibilidade nas cadeias logísticas, pois os fluxos tradicionais entre o Oriente e o Ocidente estão a ser redistribuídos para responder às novas realidades geopolíticas. Este fenómeno não só exige portos mais versáteis, como também sublinha a importância de uma abordagem colaborativa entre operadores, governos e organizações internacionais. Mas nada de novo. O Setor sempre esteve em constante mudança.
Além disso, limitações físicas e operacionais em importantes pontos de estrangulamento, como o Canal do Panamá e o Canal de Suez, pressionam a infraestrutura portuária global a adaptar-se rapidamente. A falta de capacidade de água no Panamá e a insegurança no Suez são exemplos claros de como eventos externos podem impactar profundamente o comércio global. Para os portos, a resposta passa por aumentar a capacidade de acomodar navios cada vez maiores e por diversificar as suas operações por rotas alternativas para mitigar os riscos associados a estas mudanças.
A adaptação às novas realidades exige também uma modernização acelerada das operações portuárias. A tendência crescente para o uso de navios com capacidade superior a 25.000 TEU apresenta desafios estruturais e operacionais significativos para os portos. É imperativo que os portos invistam na expansão das suas capacidades físicas, mas também na adoção de novas tecnologias que melhorem a eficiência, a segurança e a sustentabilidade das suas operações. Apenas os portos que conseguirem equilibrar estas exigências terão condições para competir eficazmente no mercado global.
A governança coordenada implica retomar uma entidade que pense o setor como acontece em Espanha com a Puertos del Estado ou outras formas, sem prejudicar a autonomia local, antes a reforçando com presença constante de administradores-delegados 100% presentes em cada porto.
A sustentabilidade tornou-se uma questão central para o futuro dos portos e do setor marítimo em geral. Em 2023, o aumento de 20% nas emissões globais de CO₂ no setor evidencia a necessidade urgente de adotar medidas de descarbonização. As regulamentações ambientais, como o Carbon Border Adjustment Mechanism (CBAM) e o Emissions Trading System (ETS) da União Europeia, exercem uma pressão crescente sobre o transporte marítimo e os portos para que reduzam a sua pegada ambiental. Estas políticas não são apenas restritivas; oferecem também uma oportunidade para que os portos liderem a transição energética, tornando-se pioneiros na implementação de soluções verdes.
No entanto, a transição para práticas mais sustentáveis está longe de ser linear. Há ainda muitas dúvidas sobre quais as tecnologias e combustíveis alternativos que prevalecerão. Gás natural liquefeito (GNL), metanol, amónia e outros combustíveis são frequentemente mencionados como opções promissoras, mas todos apresentam desafios em termos de infraestrutura, custos e impacto ambiental. Para os portos, investir em tecnologias verdes requer uma abordagem estratégica que equilibre o risco com o potencial de retorno a longo prazo.
A adoção de práticas sustentáveis não é apenas uma necessidade ambiental; é também uma oportunidade estratégica. Portos que lideram a transição para soluções mais verdes não só cumprem os requisitos regulamentares, como também se posicionam como líderes globais em inovação e sustentabilidade. Este posicionamento atrai novos investimentos e fortalece a sua competitividade no mercado internacional, além de contribuir para um futuro mais equilibrado e sustentável.
A relação entre os portos e as cidades que os acolhem é, frequentemente, marcada por tensões. Por um lado, os portos são fontes de emprego e desenvolvimento económico; por outro, o seu impacto ambiental e as perturbações causadas pelas operações portuárias podem gerar conflitos com as comunidades locais. Transformar esta interação numa parceria estratégica é essencial para mitigar os impactos negativos e maximizar os benefícios mútuos.
Planeamento conjunto entre autoridades portuárias e municipais pode ser uma ferramenta poderosa para abordar estes desafios. Medidas como a devolução de áreas portuárias desativadas para usos urbanos, a criação de corredores verdes e a integração de infraestruturas portuárias com as redes de transporte urbano podem melhorar significativamente a qualidade de vida nas cidades portuárias. Além disso, parcerias que promovam a educação, a formação e o envolvimento das comunidades locais no planeamento portuário podem reforçar a aceitação social das operações portuárias.
A evolução desta relação para um modelo de cooperação estratégica e simbiótica beneficia todas as partes envolvidas. Os portos ganham legitimidade e apoio local, enquanto as cidades recebem infraestruturas e investimentos que melhoram a sua atratividade. Este modelo é particularmente relevante num contexto em que a sustentabilidade e a integração comunitária são prioridades cada vez mais valorizadas.
As vocações dos portos e a especialização dos portos em nichos específicos é uma estratégia que pode aumentar significativamente a sua competitividade. Em vez de tentar competir em todos os segmentos, os portos podem concentrar os seus recursos em áreas onde têm vantagens competitivas naturais, como energias verdes, contentores, cereais, turismo ou logística de alto valor. Este modelo não só maximiza o retorno do investimento, como também reduz a duplicação de esforços e promove a eficiência no setor.
A governança coordenada implica retomar uma entidade que pense o setor como acontece em Espanha com a Puertos del Estado ou outras formas, sem prejudicar a autonomia local, antes a reforçando com presença constante de administradores-delegados 100% presentes em cada porto.
A especialização também permite que os portos diversifiquem as suas economias e criem cadeias de valor mais robustas. Por exemplo, um porto especializado em contentores pode atrair empresas e indústrias associadas, criando um ecossistema que beneficia toda a região. Da mesma forma, portos que se concentram no turismo podem desenvolver infraestruturas e serviços que aumentam a atratividade das suas cidades anfitriãs.
A adoção desta abordagem requer uma coordenação cuidadosa entre autoridades portuárias, governos e investidores. É fundamental que os portos desenvolvam estratégias coordenadas, baseadas numa análise profunda do mercado e das suas capacidades internas, evitando duplicação de investimento público. Quando bem executada, a especialização pode transformar os portos em líderes globais nos seus respetivos nichos.
A eficiência e a sustentabilidade dos portos dependem de uma governança moderna e integrada. A coordenação entre diferentes níveis de governo, operadores portuários e outras partes interessadas é essencial para garantir que os portos se alinhem com as tendências globais e com as necessidades locais. Uma visão estratégica que equilibre autonomia operacional com coordenação setorial pode melhorar significativamente o desempenho dos portos.
Maior autonomia operacional permite que os portos respondam de forma mais ágil às mudanças no mercado e nas regulamentações. No entanto, esta autonomia deve ser acompanhada por uma visão coordenada que promova sinergias entre portos e evite concorrência desnecessária. Planeamento conjunto e alinhamento estratégico são fundamentais para maximizar os recursos disponíveis e garantir um desenvolvimento equilibrado e sustentável.
A implementação de uma governança moderna exige também a digitalização e automação das operações portuárias. Estas tecnologias não só aumentam a eficiência e reduzem custos, como também melhoram a transparência e a responsabilidade, elementos essenciais para construir confiança entre todas as partes envolvidas. A governança coordenada implica retomar uma entidade que pense o setor como acontece em Espanha com a Puertos del Estado ou outras formas, sem prejudicar a autonomia local, antes a reforçando com presença constante de administradores-delegados 100% presentes em cada porto.
Os portos encontram-se numa encruzilhada histórica. A sua localização estratégica e o papel central nas cadeias logísticas globais oferecem-lhes uma oportunidade única para liderar o futuro do comércio internacional. No entanto, a capacidade de adaptação às tendências globais, como a sustentabilidade, digitalização e integração comunitária, determinará o seu sucesso a longo prazo. O próprio enquadramento legal deverá ser simplificado e melhorado, modernizando-se e flexibilizando-se a atividade, abrindo a maior concorrência, com mais investimento privado.
A transformação dos portos em hubs modernos, sustentáveis e integrados não é apenas uma oportunidade, mas uma necessidade estratégica. Apenas através de um planeamento estratégico e de uma abordagem colaborativa os portos poderão superar os desafios do século XXI e consolidar-se como motores de desenvolvimento económico e conectividade global. A janela de oportunidade está aberta, mas exige ação decisiva e coordenada.
VÍTOR CALDEIRINHA
Professor Universitário de Gestão Portuária
Boa sorte…
Este sistema de governação dos portos já foi proposto há muito tempo e não foi concretizado porque eliminava muitos lugares de administração para militantes e simpatizantes dos partidos políticos que alternam o poder.
Enquanto os administradores portuários forem nomeados por interesses políticos e não por mérito de competência, ou seja, como em Singapura, por méritocracia, honestidade e pragmatismo, tal nunca se conseguirá.
O sistema proposto há muito tempo seria uma entidade com um Presidente da Administração dos Portos de Portugal e com um vogal por cada Porto, o qual seria o Administrador Delegado que referes, que estaria residente no Porto que Administra.
Para além disso haveria um Diretor Geral em cada Porto, responsável pela sua Gestão Corrente, o também há muito tempo falado “Harbour Master”.
Desta forma haveria uma gestão conjunta dos Portos e uma decisão de investimentos concertada, para além de um apoio financeiro cruzado, entre os Portos com maiores rendimentos e os Portos com menores rendimentos e a necessitar de maiores investimentos, para os quais muitas vezes não dispõem de acesso a fundos para os realizar.
Por fim, deixavam de pagar IRC, sendo os resultados concentrados num único fundo que seria utilizado de acordo com as necessidades de cada Porto e aprovado pelo orgão de gestão dos Portos de Portugal.
Como tudo isto mexia com muitos “interesses” instalados e com muitos “jobs for the boys” as forças politicas mexeram-se para não permitirem que esta ideia fosse em frente. Sabe-se lá porquê???
Desculpa o pessimismo mas já vi e acompanhei muita coisa destas na minha vida profissional e de vez em quando alguém tenta voltar à carga com boas ideias já pensadas e repensadas, e nada se concretiza. Mesmo que fosse só de quando em vez.