O relatório de acompanhamento do mercado portuário de maio de 2024, da AMT, revela importantes tendências e dados sobre o desempenho dos portos comerciais do continente.
De janeiro a maio de 2024, o sistema portuário nacional apresentou um crescimento de 7% em comparação ao mesmo período de 2023, movimentando 37,7 milhões de toneladas. Este aumento foi impulsionado principalmente pelo porto de Sines, que registou um crescimento de 16,6%, e pelo porto de Lisboa (+1%), enquanto os outros portos enfrentaram pequenas quebras no volume de carga.
O movimento de contentores aumentou 14,7% nos primeiros cinco meses de 2024, com um total de 1,4 milhões de TEU. Este crescimento foi significativamente influenciado pelo porto de Sines, que sozinho movimentou 806 mil TEU, representando uma parcela substancial do tráfego de contentores (59,7%), embora se trate, na maioria (80%), de contentores em transhipment duplamente contabilizados, uma vez que sofrem duas operações no terminal portuário, descarga e carga.
Sines mantém uma posição dominante com uma quota de mercado de 54,8% no movimento de cargas, seguido por Leixões, Lisboa, Setúbal e Aveiro. Apesar do crescimento em Sines e Lisboa, outros portos enfrentaram alguma redução no volume de carga.
A Carga Contentorizada representa 42% do total de movimentação, seguida pelos Produtos Petrolíferos e Petróleo Bruto. No entanto, outras categorias apresentaram variações importantes, com destaque para a redução do movimento de carga Ro-ro e do gás liquefeito e para o aumento do movimento de carvão (Setúbal) e de minérios.
O desembarque de mercadorias, incluindo operações de transhipment, representou 58,7% do tráfego total, com um crescimento de 3,2%. Os embarques cresceram 12,9%, destacando o dinamismo do comércio de exportação.
De janeiro a maio de 2024, observou-se uma redução de 3,4% nas escalas de navios nos portos, totalizando 3.998 escalas. Esta redução foi mais pronunciada em portos menores, enquanto Lisboa e Portimão registaram ligeiros aumentos.
O sistema portuário nacional superou o espanhol em termos de crescimento percentual de movimentação de carga (+7% contra +3,5%). Já o porto de Tanger Med cresceu 10% no primeiro trimestre. Portugal também liderou no crescimento do tráfego de contentores, embora a Espanha movimente volumes absolutos maiores (230 versus 38 milhões de toneladas).
A evolução positiva do movimento de carga em Sines destaca a importância da crise temporária do Suez, que tem beneficiado os portos próximos do cruzamento entre o Atlântico e o Mediterrâneo e tem “secado” os portos interiores do Mediterrâneo. Apesar disso, adivinham-se dificuldades com a implementação do sistema de taxas das emissões de CO2 dos navios (ETS), com o fim da aliança entre a Maersk e a MSC e com a esperada concentração da MSC em Valência, porto mais próximo de Madrid.
Esta preocupação com as condições específicas deste crescimento pontual no primeiro trimestre de 2024 deve ainda considerar a tendência dos últimos anos. Numa análise dos valores de movimentação de carga nos Portos do Continente da AMT e IMT, em milhares de toneladas, de 2006 a 2023, podemos examinar as tendências e possíveis razões para as variações.
No início do período referido, observa-se um crescimento constante, de 64.868 mil toneladas em 2006 para 66.384 mil toneladas em 2007, com uma ligeira queda para 65.005 mil toneladas em 2008. Este crescimento inicial pode ser atribuído a uma economia global relativamente estável e à capacidade dos portos de aumentar a sua eficiência e volume de carga. A leve queda em 2008 coincide com a crise financeira global, que afetou negativamente o comércio internacional.
Em 2009, os portos registaram uma queda significativa para 60.645 mil toneladas, refletindo o impacto total da crise financeira de 2008. A redução na procura global de bens e a contração do comércio internacional explicam esta diminuição no volume de cargas. A capacidade de resposta a este choque económico foi crucial para a recuperação subsequente.
Nos anos seguintes à crise, os portos do continente mostraram uma recuperação notável, com os volumes a subirem para 65.050 mil toneladas em 2010 e 66.893 mil toneladas em 2011. A recuperação pode ser atribuída a políticas económicas de estímulo, recuperação gradual da economia global e a melhorias na infraestrutura e eficiência operacional dos portos.
A evolução positiva do movimento de carga em Sines destaca a importância da crise temporária do Suez (…). Apesar disso, adivinham-se dificuldades com a implementação do sistema de taxas das emissões de CO2 dos navios (ETS), com o fim da aliança entre a Maersk e a MSC e com a esperada concentração da MSC em Valência, porto mais próximo de Madrid.
De 2012 a 2015, observa-se um crescimento consistente, com um aumento de aproximadamente 31% no volume de cargas, culminando em 89.332 mil toneladas em 2015. Este período de expansão pode ser explicado pelo aumento da globalização, incremento no comércio internacional e investimentos na infraestrutura portuária, que melhoraram a capacidade de movimentação de carga.
Em 2016, o volume de cargas atingiu 93.887 mil toneladas, continuando a aumentar para 95.919 mil toneladas em 2017, antes de cair para 92.680 mil toneladas em 2018. Este pico parece refletir o auge da capacidade portuária e a saturação do mercado, enquanto o leve declínio em 2018 pode ter sido um ajuste natural após anos de crescimento robusto.
O período de 2019 a 2020 apresentou desafios significativos, com uma redução para 81.864 mil toneladas em 2020, principalmente devido à pandemia de COVID-19, que causou interrupções significativas nas cadeias de abastecimento globais e reduziu a procura por transporte de mercadorias.
Em 2021, o volume de cargas aumentou para 85.663 mil toneladas, indicando uma recuperação pós-pandemia, embora os números de 2022 (85.234 mil toneladas) tenham mostrado uma ligeira estabilização. A recuperação foi sustentada por um ressurgimento na procura global e a adaptação das operações portuárias às novas normas de saúde e segurança.
Em 2023, observa-se uma ligeira diminuição para 83.355 mil toneladas. Isso pode sugerir que, embora a recuperação tenha sido sólida, os portos ainda enfrentam desafios relacionados com a recuperação total do comércio global, incluindo tensões geopolíticas e mudanças nas cadeias de abastecimento.
Vamos agora analisar os dados da carga contentorizada do Porto de Sines entre 2012 e 2023.
O período de 2012 a 2015 foi marcado por um crescimento significativo na carga contentorizada no Porto de Sines, aumentando de 6.021 mil toneladas em 2012 para 16.460 mil toneladas em 2015. Este crescimento pode ser atribuído à expansão da infraestrutura portuária, aumento do comércio internacional e a posição estratégica de Sines como um importante hub logístico.
Entre 2015 e 2017, o crescimento continuou, embora a um ritmo mais moderado, atingindo 20.910 mil toneladas em 2017. A continuidade desse crescimento sugere um fortalecimento das operações logísticas e a capacidade de atrair novas rotas de navegação e parcerias comerciais.
Em 2018, a carga contentorizada atingiu 22.051 mil toneladas, o valor mais alto até então, seguido por um declínio para 17.134 mil toneladas em 2019. Este declínio pode ser explicado por flutuações na procura global, ajustes nas cadeias de abastecimentos e eventos económicos e geopolíticos que afetaram o fluxo de mercadorias.
Em 2020, durante a pandemia de COVID-19, a carga contentorizada aumentou novamente para 22.026 mil toneladas. Isso demonstra a resiliência do Porto de Sines em tempos de crise, devido à sua infraestrutura avançada e capacidade de adaptação às novas normas de operação.
Após o pico em 2020, a carga contentorizada caiu para 19.603 mil toneladas em 2021, mas voltou a subir para 20.438 mil toneladas em 2022, antes de registar 20.009 mil toneladas em 2023. Estas variações refletem um ajuste pós-pandemia no comércio global e nas linhas regulares de contentores, com recuperação da procura em certos setores e desafios contínuos em outros.
As variações ao longo dos anos podem ser atribuídas a vários fatores, incluindo a evolução das cadeias globais, políticas comerciais internacionais, melhorias contínuas na infraestrutura portuária e eficiência operacional, além de investimentos em tecnologia e sustentabilidade.
O crescimento sustentado da carga contentorizada em Sines reforça a sua importância como um dos principais portos de entrada e saída de mercadorias em Portugal. A sua localização estratégica na costa atlântica oferece vantagens competitivas para o transhipment e conexões com outros continentes.
As perspetivas futuras para o Porto de Sines são positivas, com potencial para atrair mais investimentos e novas rotas comerciais. A colaboração com mais parceiros internacionais e o fortalecimento de sua posição no mercado global de logística podem estimular ainda mais o crescimento.
Para garantir um crescimento sustentável, os portos devem diversificar suas operações, expandir parcerias comerciais e adaptar-se às mudanças no comércio global, como o aumento do comércio eletrónico. Investimentos contínuos em infraestrutura e capacidade de resposta a crises futuras também são cruciais para manter a competitividade dos portos do continente.
VÍTOR CALDEIRINHA
Professor Universitário de Gestão Portuária
“O crescimento exponencial do volume de carga nos portos é, sem dúvida, uma excelente notícia para a economia, mas também levanta uma questão crucial: como estamos preparados para garantir a segurança nas inspeções de ilícitos e contrabando? Com o aumento no fluxo de mercadorias, os métodos tradicionais de inspeção podem não ser suficientes para detectar ameaças, especialmente com o uso crescente de tecnologias mais sofisticadas pelos criminosos. Será que estamos investindo adequadamente em tecnologias avançadas, como a inteligência artificial e a inspeção não intrusiva por raios-X, para acompanhar esse aumento de demanda e garantir a segurança das operações?”
Se olhar para o volume do transhipment em Sines e para os valores globais verá que as variações são mínimas ou circunstanciais (encerramento da refinaria de Leixões, por exemplo). Os volumes têm variações não significativas, dependendo apenas, para os grandes números, dos contentores de Sines…
Sem o transhipment os volumes são substancialmente constantes desde a década de 1970…