A descarbonização dos portos foi o tema do segundo painel do quarto dia da PORTO MARITIME WEEK e juntou Amadeu Rocha, da APDL, Felipe Mello, do Grupo ETE, Diogo Marecos, da Yilport Iberia, e Rosário Rocha, da Prio Energy, numa sessão moderada por Fernando Gonçalves.
Amadeu Rocha falou sobre os projectos em curso no porto de Leixões, não só ao nível da descarbonização como também abordou a própria sustentabilidade económica, social e ambiental. E ter um porto sustentável não só é uma necessidade como permitirá ganhar competitividade no longo prazo. Amadeu Rocha salientou que “cada vez mais temos de ser pró-activos, jogar na antecipação, cooperar. A sustentabilidade exige coordenação e colaboração. O ecossistema portuário é o exemplo disso, porque abrange um grande conjunto de actores, que por si sós não podem resolver um problema”.
O responsável adiantou que “a transição energética, que é outro termo muito associado à descarbonização, está dependente dos ritmos dos “activos verdes” e da sua penetração no mercado. Estamos a “destruir” uma economia tradicional baseada em combustíveis fósseis e a passar para uma economia verde, azul, circular…uma economia sustentável. Mas ainda existem alguns enigmas e o principal é saber qual é o combustível do futuro. Será só um ou vários? Temos de experimentar mais e planear menos. Os mercados estão muito vulneráveis mas parece que a proximidade entre centros de consumo e de produção é uma estratégia de futuro que está para durar”.
Segundo a ESPO, os desafios futuros e as prioridades para os portos têm uma grande componente nas áreas do ambiente e das energias, com Amadeu Rocha a acrescentar que os “portos, além de serem hubs logísticos e de transporte, serão hubs energéticos, ambientais e urbanos. Mas não se consegue isso sem meios financeiros e sustentabilidade económica”. Sobre Leixões, Amadeu Rocha realçou que aquela infra-estrutura pretende ser um porto de referência no sul da Europa na transição para um sistema energético baseado na utilização dos seus próprios recursos naturais, com a ambição de ser um porto autossuficiente e de emissões zero em 2035, quinze anos antes do estipulado pelo Pacto Ecológico Europeu “Green Deal” para a neutralidade carbónica.
Isso será conseguido através de sete planos de acção, que incluem a descarbonização das actividades portuárias, electrificação dos cais e terminais, uso de combustíveis verdes, produção de energias verdes/renováveis, da digitalização e dos sistemas de gestão e monitorização da qualidade do ar. A administração portuária tem vindo também, ao longo dos anos, a implementar diversas políticas ambientais que permitem reduzir a sua pegada carbónica, como por exemplo, a aposta na eficiência energética dos edifícios, na aquisição de veículos eléctricos, como o tractor elétrico Ecotruck (em testes no TCL), na aquisição de rebocadores com uma componente verde muito forte, na promoção do transporte ferroviário, entre outras medidas.
Felipe Mello, do Grupo ETE, disse que “recentemente ganhamos o contrato para a construção do primeiro ferry elétrico da Península Ibérica, que vai operar em Aveiro, e importa dizer que este será um projecto 100% português. Tendo em conta os objectivos de descarbonização, que serão reforçados na próxima COP 26, neste sector existem várias formas de atingir essas metas, como o investimento na eficiência energética dos equipamentos portuários, o investimento nos combustíveis utilizados e a reconversão energética dos próprios equipamentos. Por exemplo, no norte da Europa tem existido um grande investimento em embarcações eléctricas para transporte fluvial. A grande dificuldade não é a tecnologia nem o armazenamento de energia, é mais a tecnologia de carregamento. E se os portos quiserem apostar nesta tecnologia, terão de investir nesta componente”.
Filipe Mello deu o exemplo do que se passou no porto de cruzeiros de La Valetta, em Malta, que passou a ter uma infra-estrutura eléctrica que permitiu aos navios desligarem os seus geradores a diesel e a “alimentarem-se” de energia eléctrica a partir de terra.
Para Diogo Marecos, da Yilport Iberia, “o tema da descarbonização está profundamente ligado à sustentabilidade. O que pretendemos fazer é melhorar e garantir o comércio e a forma como actuamos nas cadeias logísticas. Estamos apostados no crescimento sustentável do nosso negócio e temos compromissos com parceiros, clientes e colaboradores nas comunidades onde estamos inseridos. Temos um grande foco nas tecnologias que podem ser viáveis e a electrificação é uma delas».
Neste sentido, o grupo está a proceder à modernização dos seus equipamentos portuários, nomeadamente através da conversão de RTG operados a gasóleo para RTG elétricos, que vão permitir uma redução de emissões na ordem dos 30%, está a realizar a substituição gradual para reachstakers ecológicos e pretende substituir os empilhadores e outros veículos ineficientes por novos equipamentos mais eficientes.
Mas o operador turco, presente em Portugal há cinco anos, está também muito atento à tecnologia do hidrogénio “o que nos facilitará imenso para atingir todas as metas de sustentabilidade que estão previstas”, disse Diogo Marecos. O administrador da Yilport Portugal referiu que “queremos ser nós, como operadores portuários, a fazer estes investimentos em soluções de sustentabilidade e modernização das nossas infra-estruturas (…) e este caminho de sustentabilidade tem de ter impacto na cadeia de valor”.
Os novos investimentos que a Yilport está a fazer nos seus terminais incluem a minimização dos impactos ambientais resultantes dos processos de movimentação; a redução generalizada do consumo energético; a substituição do consumo de combustíveis fósseis por energia eléctrica, reduzindo as emissões e ruído; dotar os terminais de equipamentos ambientalmente sustentáveis; adoptar sistemas de aproveitamento de energia regenerada pela própria operação nos pórticos de cais e de parque, reduzir emissões de CO2, diminuir os custos energéticos, ter melhores condições de segurança, aumentar a capacidade de recepção de navios de maior dimensão, reduzir os custos de transporte na cadeia logística, beneficiar de maior eficiência nas operações portuárias e atrair novos armadores e mais cargas.
Rosário Rocha, da Prio Energy, falou sobre a descarbonização portuária e as soluções que a gasolineira tem disponíveis no mercado. A empresa portuguesa distribui e comercializa combustíveis líquidos e conta com um terminal de armazenagem e uma fábrica de biodiesel em Aveiro. Segundo Rosário Rocha, “a nossa grande missão é produzir e fornecer energia para mover pessoas, ideias, veículos e bens. A Prio tem apostado cada vez mais na inovação, nas energias acessíveis e seguras e na energia para criar valor”.
Entre as soluções que disponibiliza está o Eco diesel, o Zero diesel e o Eco bunkers. Os dois primeiros combustíveis estão mais focados na componente rodoviária (podendo também ser utilizados em equipamentos portuários) e os dois últimos podem ser usados em frotas marítimas. Rosário Rocha falou sobre as diferenças entre os diferentes combustíveis e realçou que o Zero diesel pode reduzir as emissões em cerca de 84%. Já o Eco diesel e o Eco bunkers permite uma redução das emissões na ordem dos 18%.
O investimento da Prio em biocombustíveis para transporte marítimo (o Eco bunkers) surgiu em Novembro do ano passado e permite, como referiu Rosário Rocha, “optimizar a performance das frotas marítimas. É um combustível de alta qualidade, produzido através de matérias-primas residuais, 100% biodegradável e compatível com a tecnologia diesel. Não exige investimentos adicionais e possui uma combustão mais limpa, com redução significativa da emissão de partículas e gases com efeito de estufa. Além disso. é um combustível mais eficiente, com reduções de consumo comprovados na ordem dos 10%”.
Já o Zero diesel, que também pode ser utilizado em frotas marítimas, é 100% renovável e está totalmente livre de energias fósseis. Tem ainda a particularidade de limpar as impurezas que se acumulam nos motores, e não é tóxico nem corrosivo.
Segundo Rosário Rocha, “o nosso objectivo passa por demonstrar o potencial da utilização dos nossos produtos em embarcações e equipamentos portuários, melhorar as condições da qualidade do ar nas regiões, beneficiando a relação das cidades com os portos e promover a sustentabilidade do transporte marítimo. Temos vários projetos-piloto em curso, um deles com a Aveiport, que começou em Fevereiro de 2021, para o fornecimento de Eco diesel para vários equipamentos. Muito brevemente vamos dar início a outro projecto, com a Administração do Porto de Aveiro e a Tinita, para o fornecimento do Eco bunkers para uma lancha de pilotos. Estamos ainda em conversações com o porto de Leixões e temos tido algumas conversas com o porto de Setúbal”.
Rosário Rocha sublinhou ainda que “todos falamos dos combustíveis do futuro e acredito que vai existir espaço para todos. Mas esta solução já existe, é compatível com o que temos e não necessita de mais investimentos”.