Foi recentemente anunciado pelo Governo Português que o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) está em boa execução e que dois terços das verbas (11 mil milhões de euros) já́ têm candidaturas aprovadas. O Metropolitano de Lisboa e a Infraestruturas de Portugal (IP) são os maiores beneficiários com financiamentos de 554 e 395 milhões de euros, respetivamente, segundo dados do Portal Mais Transparência.
No cenário atual de escassez de materiais, hiperinflação e falta de mão de obra, o desafio do PRR será́ o de garantir condições de execução e conclusão das obras públicas beneficiárias, o qual poderá́ ser alcançado através da utilização de formas eficientes de mitigação desses riscos geradores de conflitos.
Em tempos de crise de funcionamento expedito do poder judicial, onde um processo judicial demora em média 10 anos a ser decidido, é urgente encontrar formas alternativas de prevenção e resolução de conflitos.
A utilização no sector da construção de mecanismos alternativos de prevenção e resolução de litígios, em especial de dispute boards ou comissões especializadas de prevenção e resolução alternativa de litígios, na Europa Continental tem vindo a ganhar expressão nas últimas décadas fruto do seu sucesso nos Estados Unidos e Reino Unido.
O primeiro dispute board foi constituído e implementado em 1975 para acompanhar a execução do projeto do túnel Eisenhower no Colorado, Estados Unidos da América. A introdução desta figura teve um êxito extraordinário e a partir de então os dispute boards começaram a ganhar popularidade em várias jurisdições, tanto no sector privado como público.
O objetivo principal dos dispute boards (…) é o de resolver em obra, em tempo real, de forma expedita, e económica, questões ou potenciais conflitos que possam surgir entre as partes durante a execução do projeto de construção…
Em termos muito sumários, os dispute board são comissões ou painéis de peritos imparciais designados ab initio pelas partes no contrato, destinados a supervisionar e acompanhar a execução da obra, proporcionando às partes um fórum de discussão destinado a prevenir e resolver questões e potenciais litígios, que eventualmente venham a surgir ao longo da sua execução.
Os membros dos dispute boards são livremente escolhidos pelas partes; são compostos em regra por um ou três membros que, e sempre que solicitados pelas partes, poderão emitir recomendações e/ou decisões vinculativas em função dos poderes que lhe são atribuídos.
O objetivo principal dos dispute boards, compostos por especialistas (por exemplo, Engenheiros, Advogados, Auditores, Geólogos, Peritos-Avaliadores, entre outros) é o de resolver em obra, em tempo real, de forma expedita, e económica, questões ou potenciais conflitos que possam surgir entre as partes durante a execução do projeto de construção, promovendo assim a continuidade do mesmo e assegurando a sua viabilidade económico-financeira.
Recentemente, em 2018, a Société du Grand Paris (SGP), encarregue da construção do Grand Paris Express – quatro linhas de metro com uma extensão de 200 quilómetros e 68 novas estações – implementou um dispute board permanente com o objetivo de emitir recomendações e opiniões sempre que solicitado. Trata-se de um modelo de dispute board inspirado nos modelos Americano e Canadiano perfeitamente adaptado e compatível com as regras que assistem a Administração Pública Francesa.
A par deste megaprojeto, os dispute boards foram também utilizados com sucesso, por exemplo, durante a construção do Eurotúnel e do Túnel do Porto de Dublin.
O êxito de todo o projeto de construção mede-se em termos estritamente comerciais.
Num ambiente atual de grande instabilidade, onde os contratos são administrados de forma muito agressiva, os conflitos que surjam durante a execução da obra e a consequente demora na resolução perante Tribunais Judiciais, têm um impacto avassalador no êxito financeiro dos projetos podendo determinar ou não a sobrevivência das partes contratantes.
As atuais práticas tradicionais de resolução de litígios, não são, na nossa opinião, compatíveis com o atual nível de desenvolvimento do setor da construção e com o atual panorama de insegurança contratual. Um Estado eficiente e dirigido à resolução justa e rápida de litígios poderá encontrar nos dispute boards uma solução eficiente de prevenção e resolução dos mesmos.
Of Counsel – JPAB Advogados