Em pleno período de COP28, anunciado com a urgência em reduzir em 43% as emissões atuais até 2030 para evitar um aumento de temperatura acima de 1,5º C dos níveis pré-industriais, será oportuno analisar como objetivos de sustentabilidade irão afetar o transporte marítimo e os portos nacionais ao longo dos próximos anos e quais os impactos em termos de competitividade.
Ao contrário do que alguns mais distraídos possam pensar, este percurso em direção a práticas mais sustentáveis já começou a dar passos decisivos há vários anos. E, por sua vez, os efeitos em termos de competitividade já estão a fazer-se sentir.
Alguns exemplos…
No Orçamento de Estado de 2021, uma alteração legislativa decorrente de normas europeias levou em Portugal à cessação da isenção do ISP (imposto sobre produtos petrolíferos) nos combustíveis utilizados em dragas portuárias, aumentando significativamente o custo das dragagens. Sendo as Autoridades Portuárias (A.P.), os principais promotores dessas dragagens, este custo veio a ter efeitos negativos na conta de exploração dos Portos cuja necessidade de dragagens plurianuais é imperativa. Seria de admitir que este custo adicional tivesse sido repercutido aos utentes dos Portos, quer através de aumento de taxas, ou de falta de investimento nos portos, procurando o equilíbrio das contas das AP.
Em termos de transporte marítimo, o futuro na U.E. começa já em Janeiro de 2024. Com a entrada em vigor do ETS (Emissions Trading System) aplicado ao Shipping veremos os navios com mais de 5000 de GT (Arqueação Bruta) a terem de pagar 100% do valor das emissões de CO2 derivadas do consumo de combustível para navios com tráfego entre portos da U.E.. Apesar de haver um período transitório de 2 anos, com descontos de 60% no valor das emissões em 2024 e de 30% em 2025, a partir de 1 de janeiro de 2026 esse impacto será total .
Atendendo a que por cada tonelada de MGO (gasóleo marítimo) consumida são emitidas cerca de 3,2 tons de CO2, para navios acima de 5000 GT, o custo do CO2 poderá vir a situar-se entre 0,5 e 3 euros por tonelada de carga transportada, dependendo da eficiência e dimensão do navio. A partir de 2027, é bem possível que todos os navios com mais de 400 GT passem a estar abrangidos pelo ETS, o que se repercutirá no aumento do custo de transporte marítimo intraeuropeu.
Será que teremos de escolher entre sustentabilidade e competitividade? Esta é uma pergunta errada. Sabemos que o caminho certo é sustentabilidade. Logo, a pergunta certa é: que fazer para não perder competitividade?
Para os navios provenientes e destinados a Países terceiros, o valor de emissões a considerar será de 50% , pelo que o custo de transporte de mercadorias de e para a UE será inferior ao do transporte intraeuropeu, nas mesmas condições de navio e distância. Logo, mais competitivo.
Se encaramos o impacto em termos de “transhipment “ de contentores, tendo em conta o ETS, a situação poderá ser mais grave. O porto de Sines perderá competitividade perante Tanger, que não será afetado pelo sistema de emissões para navios cuja proveniência e destino sejam países terceiros.
Se juntarmos a estas alterações regulatórias a perda de carga nos portos nacionais devida à transição energética, a situação piora. Com o encerramento das centrais a carvão e da Refinaria de Leixões, encerradas por motivos de sustentabilidade, verificou-se a redução de cargas nestes portos, significando menos carga para distribuir os custos fixos portuários, logo, reduzindo a competitividade em relação a outros portos.
Será que teremos de escolher entre sustentabilidade e competitividade?
Esta é uma pergunta errada. Sabemos que o caminho certo é sustentabilidade.
Logo, a pergunta certa é: que fazer para não perder competitividade?
Exemplificando…
A transição energética também traz boas notícias.
Damos as boas vindas a projetos como a AURORA LITHIUM, a dar os primeiros passos para ser uma realidade no Porto de Setúbal, com grandes preocupações ambientais e trazendo além de volume de carga ao porto a criação de valor e de emprego para a região .
A Lisnave tem um projeto ambicioso para desenvolver o cluster de turbinas eólicas flutuantes offshore, para as quais existirá mercado em Portugal, dentro dos 10 GW que o (ainda atual) governo pretendia concessionar até 2030 .
Também em Setúbal, a Etermar já está no bom caminho com projeto e instalações para produção de turbinas eólicas flutuantes, trazendo mais valor, mais cargas e mais competências ao Porto e à região.
Também para Sines não faltam projetos no âmbito da transição energética, atendendo às condições únicas do Porto para novas fontes de energia, como o hidrogénio verde .
Oxalá o processo de licenciamento e financiamento destes projetos – tendo em conta a dimensão estratégica e o impacto nacional – seja considerado prioritário pelas Autoridades permitindo a sua implementação em tempo útil.
Não tenhamos dúvidas: para os investidores, caso não seja possível investir em Portugal, em tempo útil, irão em busca de outros locais alternativos.
Se olharmos para os Tarifários portuários (e os de 2024 estarão para breve) vemos claras oportunidades de melhoria .
Seria interessante encontrar verdadeiros incentivos para fomentar e premiar a sustentabilidade:
– “desconto de 3 % nas taxas de uso de porto para navios classificados com Roterdam Green Award ou movidos a LNG“.
Não será pouca ambição quando se pretende reduzir em 55 % as emissões na UE em 2030 ?
– Shore Power – havendo navios que aportam regularmente a costa portuguesa, desligar os geradores e receber eletricidade de terra é uma possibilidade, mesmo sem investimento público.
Não seria de criar verdadeiros incentivos para esse investimento a bordo desses navios para receber eletricidade e nas instalações em terra para poder fornecê-la e assim permitir que sejam desligados os geradores? Não seria possível incentivar os concessionários portuários para acelerar essa transição energética?
– Navios mais sustentáveis – estando em curso um processo de renovação de frotas, para navios mais eficientes, não seria de discriminar positivamente esses navios? Sabemos que a construção de novos navios, mais eficientes, levará o seu tempo e que a incerteza quanto aos novos combustíveis, aliada à disponibilidade de estaleiro e de capital, atrasam este processo.
Todavia, a Regulação e o Tarifário Portuário poderão dar o seu contributo positivo para que a transição não seja com aumento de custos mas também com incentivos para aqueles que queiram investir em navios e infraestruturas mais sustentáveis .
Esperemos que o próximo Governo esteja mais atento aos Portos e ao Transporte Marítimo, com olhos no futuro.
Caso a TAP e o Novo Aeroporto de Lisboa permitam…
PEDRO VIEGAS GALVÃO
CPC – Conselho Português dos Carregadores