Afinal, o que deverá entender-se por Parcerias Público-Privados (PPP)? A dúvida, confesso, colocou-se-me já por mais de uma vez, e desta feita, face aos desenvolvimentos da semana, decidi-me a tentar esclarecê-la.
Debalde. Porque o dicionário que consultei (a versão online da Priberam, passe a publicidade) pouco ou nada me ajudou. Acontece.
Comecei pela
parceria
(parceiro + -ia)
s. f.
s. f.
1. Sociedade comercial em que os sócios, parceiros ou compartes, apenas são responsáveis pelo quinhão ou parte com que entrarem e só lucram na proporção do que deram.
2. Relação de colaboração entre duas ou mais pessoas com vista à realização de um objectivo comum.
As nossas PPP não são, não podem ser isto!
Porque: 1) o parceiro Estado é sempre mais responsável e lucra sempre menos que os parceiros privados;
2) a relação até pode ser de colaboração, mas dificilmente se poderá dizer que o objectivo do público é comum ao dos parceiros privados… a menos que se conceda que ambos visam o lucro destes últimos. Recuso-me a admiti-lo.
Insatisfeito, procurei
parceiro
(latim partiarius, -a, -um, que tem uma parte)
1. Que tem poucas diferenças em relação a outro. = PARELHO, PAR, SEMELHANTE
s. m.
s. m.
2. Pessoa ou entidade que está em parceria com outra para atingir o mesmo objectivo. = COMPANHEIRO, COMPARTE, PAR, QUINHOEIRO, SÓCIO
3. A pessoa com quem se joga ou dança.
4. [Portugal: Regionalismo] [Portugal: Regionalismo] Tratamento recíproco dos que foram mordomos numa festividade ou confraria no mesmo ano.
5. [Portugal: Regionalismo] [Portugal: Regionalismo] Tratamento recíproco dos pais dos cônjuges.
6. [Popular] [Popular] Pessoa que tem esperteza. = ESPERTALHÃO, FINÓRIO
O desconcerto repetiu-se. Descontados os regionalismos, também estas definições pareciam não resolver a minha dúvida.
Porque: 1) existem muitas diferenças entre o público e o privado, com prejuízo daquele;
2) o objectivo que ambos perseguem não é seguramente o mesmo;
3) o jogo está viciado e um dos parceiros – o público – ou não sabe dançar, ou não conhece a música, ou ambas as coisas.
Até que cheguei à definição popular, e fez-se luz, certamente não por acaso!
De facto, às tantas, estes parceiros, públicos e privados, das nossas PPP serão, mais do que tudo, uns rematados espertalhões! Uns finórios! Para mal nosso, os papalvos…
Enfim, a minha incursão no dicionário, se não me sanou as dúvidas fortaleceu-me um preconceito que tenho das PPP desde o início: é que é difícil, para não dizer impossível, ser parceiro, estar em pé de igualdade com alguém com quem se tem uma relação de dependência.
No caso das PPP, o Estado, desejoso de fazer obra e sem dinheiro nos cofres (para já não falar noutras motivações mais mesquinhas e perniciosas), pôs-se a jeito para ser explorado pelos seus parceiros privados e pela banca que financia as duas partes. O resultado está à vista. Ou, o que será bem pior, ainda está para ser visto!
Uma nota final, para evitar confusões: as PPP a que aqui aludo são as PPP rodoviárias. Como é sabido, as concessões portuárias, também elas PPP, são genericamente boas para o Estado e para a economia nacional. E a PPP ferroviária é hoje um caso único no transporte público de passageiros, sublinhado pelo próprio Tribunal de Contas.
FERNANDO GONÇALVES